Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

2004Crônicas

Um certo casal em Campinas

Imagine o rebuliço naquela Campinas tão diferente da de hoje. Ano fraquinho aquele 31 — calmaria a prenunciar a saga de 32.

Eis que naquela manhã de setembro de 1931, chega ao pacato burgo o trem da Paulista que vinha de São Paulo. A mesma estação que já foi um marco na cidade, para onde se discava 3438 para saber a hora certa e os campineiros acertavam seus relógios pelo apito do trem. O mesmo saguão de bilheterias, onde na tabuleta se lia “Trens para o Interior”, se enchia de gente que vinha da Capital para as terras da Mogiana. E foi num desses trens que desembarcaram Maria Manoela e Idalina Averzani, digo, “Dorival” e Idalina.

A passagem do ‘casal’ por aqui, para fazer a baldeação com destino a Ribeirão Preto, foi notícia da edição de 13 de setembro do jornal “A Cidade”, de Ribeirão, que logo fará um século. Garimpando curiosidades para os fascículos comemorativos do centenário, o repórter Nicola Tornatore descobriu a aventura das duas. Foram ‘pegos’ (ou ‘pegas’?) em Belo Horizonte. De lá, recambiados (!) para São Paulo, de lá pra cá e daqui para aqui (que confusão!)

O certo é que quando a Ribeirão chegaram, esperava-as uma multidão de curiosos na “gare” da Mogiana, mas nenhum ativista do GLS. Hoje, também não apareceria, posto que não mais carece.

Mas “Dorival” desceu de cabeça enfaixada! “Ai Jesus, Maria e José!”. Diz a notícia que, em Campinas, ‘Dorival’ tentou se matar, assim que o trem parou junto à plataforma, “no que foi impedido por dois inspectores que o acampanhavam”. Para o repórter de antanho, “ele” confessou que já fôra amasiado de duas mulheres — antes de conhecer Idalina – em Bica de Pedra (donde fica?) e Bauru.”

‘Dorival’ alegou que suas ‘ex’ queriam aprender com ele o ofício de alfaiate. Mas… “Disse-nos Idalina que sempre julgou que seu marido fosse ‘homem’, embora, durante o casamento, (ele) não lhe desse atenção, ‘por estar sempre doente.’”.

Para o mesmo repórter, Manoela jurou que voltaria a ser mulher. Tanto que, creia, o jornal fez uma subscrição na cidade e arrecadou 183 mil réis, suficientes para comprar uma fatiota toda branca para ‘Dorival’. Quando viu o ‘marido’ vestido de Manoela, Idalina teve uma crise de choro. Queria porque queria Manoela sempre ‘Dorival’. Fim da história: Manoela caiu no mundo e Idalina devolvida ao pai, sob protestos do jornal. Afinal, ele vivia num bordel e enxotara a filha de casa quando ainda menina, logo após perder a mãe.

Pregado no poste: “Esse ‘casal’ tinha de aprontar logo em Campinas?”

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