Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

2003Crônicas

O papa e o rádio

O (excelente) radialista Adelzon Alves protagonizou, no melhor estilo carioca, como começou o Papado de João Paulo II. Agora, eu conto para ele (e todo o mundo) como o caso então se deu, há 25 anos.

Caro Adelzon,

“Vou contar uma historinha rápida. Você sabia que é personagem principal de uma edição histórica do Estadão? Eu era chefe de reportagem do jornalão e quando chegava em casa, seu programa (que eu não perdia por nada) na Rádio Globo, do Rio de Janeiro, já começara – você, o eterno ‘amigo da madrugada’. De repente, você interrompe a entrevista com um sambista e avisa: ‘Gente boa, fique atenta, parece que o Papa morreu de novo. Daqui a pouco, na edição do Globo no Ar!’. Pulei da cama.

Pensei: ‘Adelzon tá me gozando! Como alguém pode ‘morrer de novo’?’ O sambista que estava com você até emendou: ‘Pois é, meu compadre. O homem assumiu há tão pouco e parece que já morreu?!’

Era 1978. Corri para o telefone, liguei para a oficina e gritei para o Teixeira, nosso secretário gráfico, o famoso e extinto: ‘Parem as máquinas!’. Ele parou… Pedi que ele corresse para a sala dos teletipos (nem existe mais isso) e me lesse tudo o que havia chegado entre meia-noite e meia e uma hora. Ele voltou ao telefone: ‘O Papa morreu! E agora?’. Eu disse: ‘Jogue fora a manchete (nem me lembro qual), pega uma foto do Papa, que você tem na oficina, e sapeca: ‘Morre o Papa João Paulo I’. Corra!’. Ele correu…

Graças a você, Adelzon, o Estadão foi o único a dar em primeiro clichê a morte daquele ‘Papa sorriso’. Por isso, foi o primeiro a chegar às bancas com a notícia. Na noite seguinte, o apresentador Celso Freitas, que apresentava o ‘Jornal das Sete’, na TV Globo (lembra?), anunciou: ‘Em São Paulo, a população tomou conhecimento da morte do Papa pelo jornal’. E entrou uma imagem inesquecível, feita pelo cinegrafista Edgard Cavalheiro: um padre velhinho, como se fizesse aquilo todas as manhãs, com a maior naturalidade, desceu as escadarias do Mosteiro de São Bento, que badalava as seis horas, e chegou à  banca. O Edgard fechou a lente nas mãos do velho padre, que as crispou sobre o Estadão, dobrou o jornal debaixo do braço e voltou pela escadaria de cabeça baixa, triste, lentamente. Uma cena e tanto.

Tão bela, que o Armando Nogueira e a Alice Maria proibiram o Luís Fernando Mercadante (então diretor de jornalismo em São Paulo) de cedê-la ao jornal, com o argumento de que poderíamos usá-la num anúncio (Puts! E que anúncio!)

Você honra o rádio que Marconi e o Padre Landell sonharam.

Um abraço.”

Pregado no poste: “Pitbul? Rotevailer? Trinta anos para o cão, perpétua para o dono!”

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