Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

2010Crônicas

‘Não é o bonde…’

Saiu na seção “Correio há 50 anos”: “O restaurante El Cairo iniciou suas atividades, constituindo-se numa firma especializada em drinks e jantar-dançante, contando com montagem dentro da técnica moderna, oferecendo o máximo de conforto e ambiente seleto. Funciona sob orientação do maître d’hotel Bellini, tendo na parte de drinks o barman Paulino Alberto, desta cidade. Fica na Rua Barão de Jaguara, 1405.”.

(Jantar dançante, pra mim, era um baile onde os casais dançavam com um prato de sopa na mão…)

Não era bem um restaurante nem bem do Bellini. No fenomenal “50 anos de sociedade campineira”, o Alex Nucci conta: “Era uma boate grande, de propriedade dos argentinos Carlos e Tamara. Para lá iam as prostitutas depois que encerravam o ‘expediente’ em suas casas, à meia-noite.”. A presença da El Cairo no centro da cidade incomodava, principalmente o pároco da igreja do Carmo, monsenhor Lázaro Müstchelle, vizinho do buchicho. Se alguém quisesse difamar alguém, era só dizer que a vítima fora vista naquele lugar.

Seis meses após a inauguração, no meio do mesmo quarteirão da Barão, o comendador Abel Pedroso e seu irmão Synésio abriram o “Jornal de Campinas”. Aí, sim, um vizinho adequado juntou o útil ao agradável. O secretário de redação do jornal era o pianista boa gente Cataldo Bove. Às onze da noite, ele trocava a redação pelo palco e a Olivetti pelo piano. O continuo levava até ele as últimas provas para conferir se estava tudo certo e ele lia no intervalo, entre uma seleção e outra, à luz de vela. Certa vez, o negócio complicou. A Prefeitura e a Cometa queriam reajustar a passagem do bonde, que era dela, e do ônibus, que era da CCTC. A Câmara foi além da hora do intervalo na boate, para decidir que o bonde não seria reajustado. Justo o bonde. O jornal não tinha foto de ônibus no arquivo. Cataldo, sóbrio e sensato como sempre, escreveu, apoiado em seu instrumento: “Não foi a passagem do bonde, como o da foto, que subiu; só a do ônibus.”.

(Antes do desfecho, é bom lembrar: para assumir o piano da El Ciro, Cataldo desalojou o pianista titular, de apelido Nicola Cego. Coitado, não enxergava a porta da boate quando chegava nem seu instrumento na hora de tocar.)

O Nucci diz que não sabe o motivo do fechamento. Contam que um ministro argentino e família – mulher e filhas –, hospedados no Hotel Términus, pediram sugestão de um lugar para “acabar a noite”. Argentino freguês de argentino… Indicaram a El Cairo. Alguns homens mais ousados confundiram mulher e filhas do visitante hermano com as primas que chegavam de suas casas de vida fácil. O pau quebrou…

Pregado no poste: “Lulla dará ‘Balsa Família’ no shopping d. Pedro”

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