Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

2002

Em defesa da Célia

Não, não se trata da querida mestra Célia Farjalat, mas ela também vai aparecer nesta conversa. É sobre a repórter Célia Froufe que, num trabalho de repórter, nada mais, descobriu que, às vezes, “mãe só tem duas”. Algumas pessoas reclamaram; houve quem se espantasse e outras se viram refletidas na notícia, e até choraram. Jornal, tanto melhor, se for o espelho da comunidade a que serve. Seria uma fraude, se escondesse da sociedade seu perfil mais nítido e chegasse à nossa casa todo embaçado. Aí, sim, mereceria uma avalanche de protestos de leitores enganados. Leitores que, com toda a justiça, deveriam virar-lhe as costas.
Não é a primeira vez e, espero, não será a última. Uma vez foi até engraçado. Escrevi uma crônica sobre o aborto – nem a favor nem contra –, mas sugerindo que se parasse com tamanha discussão e deixasse para a mulher decidir. Quem for contra, que não aborte, ora bolas! Assim como o divórcio, cáspite! Só que na hora de paginar, o computador, muito generoso comigo, publicou a crônica como sendo de autoria da mestra de todos nós. Coitada! O primeiro telefonema de protesto já veio ao raiar do dia – era o padre da paróquia, indignado. Agora, dona Célia vira alvo, de novo. A notícia da Célia Froufe saiu apenas com suas iniciais, no fim do texto (CF). Tipo da confusão comum em vários jornais.
Nada contra os leitores que protestaram por causa da notícia de uma menina de onze anos, que se sente bem, agora que vive com a mãe, uma arquiteta, e sua nova companheira, uma engenheira. Ela mesma se lembra com tristeza das brigas constantes entre o pai e a mãe, tanto que escolheu a nova forma de vida, para viver em paz, sem abandonar a convivência com o pai. Para mim, essa garota deu uma lição aos dois.
Insisto: nada contra quem reclamou daquela publicação. Pelo contrário, devem reclamar sempre. Afinal, quando se levanta a ponta de um tapete social, o que se vê pode ser chocante. Mas todos têm o sagrado direito de saber o que há sob o chão que pisa e protestar, aplaudir ou ficar indiferente diante do se viu. A história pode chocar a alguns, confortar outros e passar em branco para muitos – como quase todas as notícias.
A diferença está na forma como o fato foi exposto ao leitor. Foi a manchete do jornal? Claro que não! Saiu com destaque na primeira página? Também não. Nem na página em que saiu mereceu grande espaço. Veio na medida certa, dentro de uma série de histórias curiosas, alegres ou tristes para homenagear o Dia das Mães – uma galeria de mães representativas de Campinas e de toda parte.
O texto da Célia Froufe fluiu naturalmente, leve, até com algum lirismo, quando descreve, por exemplo, o presente que a menina prepara na escola para suas “duas mães”. É uma notícia, não uma denúncia que valesse alertar a população. Há repórteres que cobrem, mas também descobrem fatos. Foi isso.
E houve quem considerasse essa notícia “pesada” ou “perniciosa” para crianças. Será que os filhos ou netos de quem julga assim nunca assistiram às novelas das cinco, das seis, das sete, das oito…? Nunca viram Ratinho, Leão, Gugu, horário político, falsos pastores eletrônicos, gigolôs da fé explorando o povo? Isso é pesado, engodo, pernicioso. Isso influencia crianças – para o mal.
Pregado no poste: “Beto Godoy, a OTAN erra o alvo ou finge?”

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