Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

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Deu tudo errado

A intenção era das melhores. O sonho, maior ainda. Achar uma imensidão de terras onde coubessem centenas de países do tamanho da matriz, estabelecer nelas um novo mundo, diferente de tudo o que se conhecia. Nada de ficar amarrado àquelas voltinhas de barco em torno do Mediterrâneo; viajar tão longe e arriscar a vida no Oriente em busca de especiarias, ouro e pedras preciosas; muito menos passar a vida contornando a África, à espera de que monstros confirmassem as lendas e devorassem os navegantes. Nada disso.  Mas também não foi nada daquilo com que sonharam.

Só vou a Portugal em sonho. Se em vidas passadas não viajava em caravelas, nas atuais, não vou de avião e nas futuras, fugirei de naves espaciais. Mas todas as vezes em que estive naquela santa terrinha, procurei, procurei e jamais encontrei aquele monumento dedicado a Dom Pedro I onde, dizem, há uma placa: “A Dom Pedro, primeiro imperador do Brasil e quarto de Portugal, a eterna gratidão do povo português por ter proclamado a independência daquela colônia d’além mar!”.

A calmaria que segurou a esquadra no meio da viagem já era um prenúncio de que eles não deveriam ter vindo. Português é teimoso, turrão… Vieram. Caminha diz na carta ao rei que gostaram muito de tudo o que viram, principalmente das índias. Está na carta: “Ali andavam entre eles três ou quatro moças, bem novinhas e gentis, com cabelos muito pretos e compridos pelas costas; e suas vergonhas, tão altas e tão cerradinhas e tão limpas das cabeleiras que, de as nós muito bem olharmos, não se envergonhavam. …E uma daquelas moças era toda tingida de baixo a cima, daquela tintura e certo era tão bem feita e tão redonda, e sua vergonha tão graciosa que a muitas mulheres de nossa terra, vendo-lhe tais feições envergonhara, por não terem as suas como ela.”. (Isso eles olharam bem.).

Mas em menos de quinze dias foi todo mundo embora. Largaram dois aqui. Dois mancebos. E até hoje, ninguém sabe deles.

E foi do cruzamento daqueles dois mancebos com milhões de índias que tudo começou. Ainda não acabou, mas está demorando para dar certo.

Pregado no poste: “Nossas ‘vergonhas’ são outras, seo Caminha!”

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