Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

2002

Depois dos 50

A vítima é de Campinas, mas ele jura que a origem dos fatos está aqui em Ribeirão Preto. Não acredito em patavina do que ele disse, só que aconteceu. Foi semana passada. Toca o telefone e sem deixar que eu pelo menos dissesse ‘tá louco?’, a voz dispara de Campinas:
— Não há nada que dê jeito. Não tenho vergonha de contar. Pode escrever no jornal, não ponha meu nome, mas a culpa é dos padres. Há trinta anos eu me formei e foi morar aí. Um padre, de uma família parceira da empresa onde eu trabalhava, ficou com dó daquela minha vida de república, mesmo já formado, e me convidou para morar no seminário, aí perto. Fui. O que é que tinha demais?
— Você morou em seminário? Mas eles aceitaram você lá? Justo você? (Nos dias de hoje, nada demais o comportamento desse moço. Mas para os padrões de trinta anos atrás, era o que chamavam de devasso, mulherengo; tipo que, diziam, ‘não valia nada’; andava pela rua de sandália havaiana, carregando violão, imagine! Não saía do Dalva e não era campeão de sinuca porque não tinha paciência de ficar mais de meia hora em volta da mesa. Não roubava nem matava, mas era amigo do peito de Tony Gato e Satã. Centroavante primoroso, mas nem Zé Duarte nem Cilinho conseguiram fazê-lo jogar pra valer. Não queria compromisso com nada. Falavam que ajudou na mudança de todas para o Jardim Itatinga e tocou na festa de inauguração de cada casa. Queriam que se candidatasse, mas criou juízo a tempo e preferiu trabalhar.)
— Eles não sabiam de nada e eu já estava regenerado; ia me casar dali a um ano. Meu comportamento era o de um monge. Do trabalho para casa, digo, pra o santuário, quer dizer, seminário, e de lá para o trabalho. Todo dia. Domingo, missa, futebol, já jogou futebol com padre?, um cineminha, meditação e cama.
— E o que isso tem a ver com?…
— Depois de três meses, não agüentei e fui falar com o superior. Padre, não tenho nada com isso, aqui é ótimo, todo mundo gente boa, até o noviço-cozinheiro. Mas comer pepino no almoço e na janta, todo dia, é muito. E ainda vem pepino no café da manhã?
— Você não sabe, meu filho? Não podemos ficar excitados, ter ereção. É por isso!
— ‘Pelamor’ de Deus, padre! Vou me casar no ano que vem…
— Não se preocupe com isso, só vai fazer efeito depois dos cinquënta…
Fez.
Pregado no poste: “Desde quando você come pepino?”

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