Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

1998Crônicas

Celly, você não sabe da maior!

Dona Odete Stein Carvalho Dias fez oitenta anos. Foi sábado passado, lá em Poços de Caldas. Festa bonita para essa bandeirante mineira que, ao lado do seu Joaquim José, luta para conservar e manter produzindo a mais antiga fazenda de café do Estado de São Paulo, sempre nas mãos da mesma família, há mais de cem anos, há mais de cem safras, colhendo e distribuindo riqueza.

É a Fazenda Recreio, um jardim nas encostas da Serra da Mantiqueira, que também passa lá pelos lados da sua querida Taubaté, no Vale do Paraíba. Mês passado, essa serra que divide Poços de São Sebastião da Grama parecia os Alpes, tão branca ficou. Mas em vez da neve gelada, foi o calor da fantástica florada do café que pintou os morros. Muitos daqueles cafeeiros têm mais de 50 anos, plantados (ou pintados?) por mestre Alcides Carvalho, do nosso Instituto Agronômico de Campinas. Falar em café, Celly, você e o Eduardo precisam tomar o cafezinho da dona Odete! É uma celebração ao que existe de melhor na natureza.

Os oitenta anos da dona Odete reuniram 200 amigos, “e só 12 não eram parentes”, contava seo Joaquim, orgulhoso, ao lado de irmãos, cunhados, filhos, sobrinhos, netos, bisnetos. “E os netos já trabalham na terra!”, emendou. Festa bonita, simples, sem pompa, para uma mulher bonita e de valor.

Mas por que estou falando da festa de aniversário da dona Odete para você, Celly? É que um momento mágico marcou aquele encontro e você não me saiu mais da cabeça. A música que abriu a comemoração era de orquestras consagradas – Glenn Miller, Ray Conniff, Billy Vaugham, e todos, de todas as idades, dançavam.

A magia começou depois do primeiro intervalo. Quando ouvi sua voz nos acordes iniciais de “Estúpido Cupido”, uma euforia tomou conta da pista. Eu não conseguia acreditar no que via. Nenhum dos que partiram para dançar tinha mais do que vinte anos! Entraram cantando a letra do seu primeiro sucesso, há quase 40 anos, Celly! A meninada, cujos pais nem eram casados quando você encerrou a carreira, vibrava. O garoto que cuidava do som não teve saída e fez a garotada tomar banho de lua, ir a um baile na Austrália, passar pelo túnel do amor, conversar com um brotinho na esquina, andar devagarinho e um broto conquistar… Uma lágrima rolou.

Você vive no coração, na consciência e no inconsciente desses jovens, Celly. Depois, vieram outros ídolos do nosso tempo: Tom Jones, Elisete Cardoso, Elis (ah, Elis!), Jair Rodrigues, Sinatra, Johnny Mathis, Bill Haley, Johnny Rivers, Paul Anka, Sedaka… E de hoje, também: Gal, Bethania, Chico, Gil, Caetano, acho que a Marina, a Simone. Até os Mamonas Assassinas ressuscitaram, por pouco tempo. Mas quem diria! Você, sozinha, empolgou uma geração inteira que nem a conheceu. Não deixaram espaço pra ninguém. A pista era deles, só deles. E sua.

No fim, falávamos da sorte de uma família capaz de, nestes tempos malucos e ameaçadores, criar jovens saudáveis, que estudam e trabalham e são felizes por fazer uma festa para a avó. Minha mulher, a Teresa Flora, que decidiu guardar aquele momento em fotografias, observou: “Quando eu perguntava aos meninos se eles queriam tirar uma foto ao lado da namorada, respondiam com orgulho: ‘Não! Eu quero tirar uma foto é com a minha avó!’” E se falou também do sucesso que você faz entre essa garotada. O segredo? Eu sei: você se apresentava para nós e, agora, para eles, sempre de cara limpa. Você, que já é avó, é autêntica, como dona Odete, a avó deles. Parabéns dona Odete; parabéns, Celly. Obrigado pelo exemplo.

 

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