Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

2000Crônicas

Caro Papai Noel

Este ano, de sacos cheios estão os campineiros. E o senhor, pelo visto, de saco vazio. E lembrar de que o senhor já percorreu esta outrora feliz cidade, distribuindo presentes para uma comunidade mais harmoniosa, descontraída e livre de ameaças! Será que neste antepenúltimo Natal do século o senhor poderia, ao menos, devolver algumas lembranças que nossa Campinas tinha naqueles tempos?

Por exemplo: já imaginou quanta alegria se os campineiros acordassem na manhã do dia 25 e deparassem com aquele Alecrim no Largo da Catedral e aqueles que o mataram, na cadeia? Ainda há pouco, acabei de ver na televisão que um dos maiores anseios da população é o fim da impunidade. Pôxa, seo Noel, não custa nada! Afinal, naqueles tempos, era sob aquela majestosa árvore, diante de nossa Matriz, que suas renas descansavam da jornada desde o Pólo Norte — um repouso abençoado. Cá entre nós, elas gostavam daquele lugar, não?

E o senhor se lembra muito bem de que atrás daquele templo outro patrimônio desta nossa terra (inacreditável, a terra de Carlos Gomes!) foi destruído. É… o Teatro Municipal. Seo Noel, o senhor não acha que a cidade merece ter outra casa, imponente, como aquela? Afinal, os campineiros não têm culpa pela demolição… Agora, não interessa se a tragédia aconteceu por jogo de interesses ou se o dito cujo estava, mesmo, caindo. Nós queremos é um teatro. Campinas sem teatro é como o Vaticano sem a basílica de São Pedro.

Justamente entre a igreja e o teatro passavam trilhos de bonde, subindo a Zé Paulino ou descendo a Treze de Maio. Seo Noel, nunca vi ninguém triste dentro dos bondes. Como era gostoso viajar neles! Não dá para nos devolver esse presente? Os trilhos? Ora, bom velhinho, o senhor sabe quem os furtou. Meta-o na cadeia, ponha os trilhos na cidade outra vez e aproveite para pôr esta cidade nos trilhos, também.

Faz tempo, também, uns vinte anos, que não se vêem bons times de futebol por aqui. O Guarani, parece, foi campeão brasileiro em 1978 antes de Cristo. Essa Ponte, coitada, há muito não leva a lugar algum. Daqui a pouco, “bugrinos” e “pontepretanos” serão substantivos abstratos, já que adjetivos, para desqualificar os times para os quais torcemos, não existem mais.

Ah! Se não for pedir muito, acabe com aquele deserto em volta do Castelo. Por favor, replante as árvores ali assassinadas. Garanto que suas renas vão adorar e agradecer. E enfie os culpados na cadeia, também, já que não há lei que permita pendurá-los nos galhos para sempre.  (Como o senhor leu no livro do professor Amaral Lapa, desde os primórdios de nossa Campinas, as gentes daqui não aceitam viver numa cidade que tenha forca. Eu também não.).

Por último, mas tão importante quanto, apelo para sua memória. Naqueles tempos, o senhor podia trazer brinquedos para os filhos dos professores, dos médicos, dos cientistas, dos servidores públicos, dos trabalhadores de quase toda a Campinas. Lembra? O senhor chegava feliz, sei que sempre gostou desta cidade. Nós éramos mais iguais, uma comunidade respeitada e invejada – até lá no Pólo, a sua terra (ou o seu gelo?). Desculpe pela brincadeira.

Agora, falando sério, pegue todos os culpados pela infeliz cidade em que transformaram nossa Campinas e leve-os para bem longe. Caso suas renas sintam fome no caminho, não aconselho o senhor a alimentá-las com eles. Tenho certeza de que se esses pedidos forem atendidos, quando o senhor voltar para o Natal de 1999, Campinas será aquela terra de que o senhor tanto gostava. E não sairá daqui chorando, como acontecerá no dia 25. Boa viagem, um afago nas renas e um beijo na “mamãe” Noel.

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