Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

2006Crônicas

‘Cabras do Leste’

(29 de março é “Dia de luto contra a farra no Congresso”. Proteste!)

Mas é muito interessante essa proposta de se criar o ‘Estado de São Paulo do Leste’, com 183 cidades, na margem direita do Tietê, encontrada nos escaninhos escusos, digo, inclusos, de Brasília, a cidade mais suja do Brasil. A descoberta é da repórter Teresa Costa, terror dos medíocres. Como diria a avó da minha irmã, “essa moça é ‘quatro pau’ pra descobrir mediocridades.”.

É uma grande oportunidade de se fazer um estado diferente, limpo, onde o poder será exercido pelo povo e não pela escória da sociedade. Um estado em que governantes, legisladores e tribunos serão obrigados a levar a vida como o povo que eles representarão – e não fingir que representam.

Imagine: nenhum município do novo estado terá câmara e prefeitura se não possuir mais de 200 mil habitantes. Os que tiverem menos serão regidos pelo prefeito da cidade maior, formando-se núcleos regionais sempre superiores a 200 mil moradores. As câmaras municipais terão um vereador para cada 100 mil habitantes. A contagem da população será feita por instituto de pesquisa estrangeiro, porque o IBGE está sob censura do governo federal.

Vereadores, prefeitos e secretários receberão a cada dois meses um salário equivalente à renda per cápita do município que os elegeu. Seus filhos serão obrigados a estudar em escolas públicas e seus dependentes só receberão atendimento médico-hospitalar em pronto-socorros e hospitais públicos. Autoridade que furar a fila será furada. Todas, absolutamente todas as autoridades só poderão se deslocar em transporte público, pagando a passagem com o dinheiro delas. Até dez anos depois de exercerem cargo público terão os bens bloqueados. Nenhuma despesa dessa ‘casta’ será paga com dinheiro público, mesmo as de trabalho. Assessores serão pagos do próprio bolso do contratante. Nenhum gabinete ou repartição terá portas – janelas sempre abertas. Ninguém poderá se reeleger. A cada promessa de palanque não cumprida, cinco anos de cadeia. (Dez é mais seguro? Então, quinze! Na cela, refeição só a enviada pela família. Autoridade presa não come – nem bebe, viu? — às custas do povo.).

A assembléia legislativa terá um deputado para cada milhão de habitantes e a remuneração será a mesma do governador, vereadores e prefeitos. O novo estado terá dois deputados federais e um senador. (E já é muito!). Nenhum ‘paralamentar’ poderá legislar sobre seus próprios salários — seus vencimentos, trimestrais, serão iguais à renda per cápita do novo estado. Nenhuma autoridade poderá ganhar mais do que professores, médicos, paramédicos, cientistas e demais servidores de qualquer nível. Todo servidor será obrigatoriamente concursado.

Em época eleitoral, o horário político terá quinze minutos de duração, sempre às três da manhã, só uma vez, e um dia antes do pleito. É proibido aos candidatos sujar a cidade com seus nomes. Nenhum logradouro terá nome de autoridade inteligente, esperta, viva, morta ou vivaldina. Nome de político em escola só com a aprovação unânime da população. Em qualquer lugar, em qualquer fila, primeiro o povo, depois as autoridades, seus familiares e convidados – mesmo que tenham chegado antes.

A conta bancária de todas as autoridades, ‘paralamentares’, seus parentes e afins ficarão abertas 24 horas por dia à consulta pública. E cada um será obrigado a dar conta de cada centavo gasto, mesmo que seja na compra de um presentinho para o amante, amásio, eutanásio, amasiado ou baseado.

O dízimo será taxado em 99,99% na bilheteria dos antigos cinemas e depois que o saquinho correr, antes de chegar ao altar. Ficam vedados o uso e a propriedade de meios de comunicação por autoridades, ‘paralamentares’, seus parentes e afins, bem como por exploradores do lenocínio religioso e gigolôs da fé – claro que só os que se julgarem nessa categoria.

O lema, no brasão do novo ‘Estado de São Paulo do Leste’ será: “Ai de vocês, doutores das leis e fariseus hipócritas”.

Um lugar assim não será chamado ‘São Paulo do Leste’, mas “São Paulo Celeste”.

Pregado no poste: “Pagar imposto para sustentar político. Não é revoltante?”

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