Presente para o Céu
Dia 30, Campinas teve de se antecipar e decidiu presentear Deus pelo Natal com a partida de um de seus filhos mais ilustres. Renato Costallat aqui viveu como um presente para toda a Humanidade e agora revive ao lado de sua Isabel, a querida mestra Bebé Ferrão. Homem humilde, porque tinha toda a humildade dos gênios. Era engenheiro ferroviário da campineira Companhia Paulista de Estradas de Ferro, em sua época, uma das cinco ferrovias mais eficientes do mundo.
É presente dele para a cidade uma obra de arte que não se faz mais: o relógio de sol. Não um relógio de sol qualquer, mas o maior da América do Sul, que por muito tempo regeu o tempo a partir dos jardins sob o Viaduto Miguel Vicente Cury. Nossas autoridades, incompetentes, abandonaram o relógio, talvez porque não soubessem dar corda nele para voltar a funcionar… Depois, recuperado, foi levado para a Lagoa do Taquaral.
Dois anos antes de partir, deixou para Campinas um singelo “Esclarecimento à Cidade”, aula de humildade, na qual se refere a uma crônica que fiz sobre ele. Agora, seu filho Vicente Ferrão Costallat me manda essa manifestação assinada pelo pai a 15 de dezembro de 2006. No envelope, o recado: “Para ser entregue ao jornal ‘Correio Popular’, depois de minha morte”:
“O autor (Renato) fez, por dever de justiça, tirar o ‘plebeu’ quadrante solar (é assim que ele chamava o relógio de sol) da obscuridade e do conceito injusto de mero ‘enfeite de jardim’ e elevá-lo ao ‘nobre’ pedestal de instrumento símbolo de arte, ciência e cultura, a honrar qualquer lugar onde se encontre: numa cidade, em praça pública, numa igreja, numa escola…
Se mais não fora, a burocracia impediu-o de levar ao conhecimento dos poderes públicos, um anteprojeto de dimensão turística. Infelizmente ele não pôde honrar o que prometera, quase solene juramento, na Câmara Municipal de Campinas, sobre a cidade: quem a ama faz tudo por sua amada… Entre eles, os patriotas que merecem as honras de inconfundíveis amantes:
- Dr. Francisco Monteiro Salles, em sua insistência em criar um quadrante solar para o Instituto Penido Burnier e depois doá-lo à cidade, o que assim aconteceu com o trabalho gratuito de seu idealizador
- Waldemar Raffa, presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Empresas Ferroviárias Paulistas, que doou ao autor um ponteiro de aço carbono, quando este já tinha desistido de salvá-lo perante a força da sanha dos vândalos impiedosos…
- Antônio Cézar Secco, engenheiro de São Paulo, que trtou do forjamento do ponteiro de aço carbono em parceria com o sr. Waldemar Raffa.
- O Sr. Orlando Rodrigues Ferreira, astrônomo a serviço do Conselho de Defesa di Patrimônio Cultura de Campinas (Condepacc), cujo trabalho resultou no tombamento do quadrante solar.
São a eles que a cidade deve agradecer, antes de propriamente ao autor.”
Pregado no poste: “Como era bom viver nesta cidade!”