Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

2002

Ontem e hoje

Você conheceu monsenhor Jerônimo Baggio? Foi pároco da igreja de Santo Antônio, aí no bairro do Botafogo, perto da Rodoviária. O homem era fogo. Outro dia, calor daqueles de inverno típico de Ribeirão Preto, disse àquela santa que mora aqui em casa, quando me levou à missa: “Se monsenhor Baggio entrasse nesta igreja hoje, aprontaria um salseiro!”. Logo de cara, um esculacho no padre: onde já se viu rezar missa em Português e de frente para a platéia, digo, para os fiéis!? “E as mulheres, como entraram aqui sem véu!?”
Estou imaginando aquele rosto gorducho, cada vez mais vermelho de indignação, óculos de aro fino, chapéu preto escondendo a calvície suarenta, missal sempre à mão direita erguida, esbravejando: “O que é essa cambada no altar tocando violão? Outro lá, com pandeiro, guitarra, bumbo – como? Bateria?” E, meu Deus misericordioso!, o padre, de batina, Santa Virgem!, cantando com eles! “Santo, Santo, Santo / É o senhor Jesus / Céus e terra passarão / Mas Sua palavra não passará! Não, não, não passará”. ( É assim?).
E o monsenhor Baggio nem tinha dado uma olhada no público. Pareciam dezenas de casais, mas, na verdade, muitos eram rapazes e moças, homens e mulheres, que jamais se tinham visto. Estavam alinhados, ele e ela, só para aproveitar a chance de pegar na mão um do outro na hora do Pai Nosso, e se abraçar depois da oração. Brasileiro não perde uma… Meninas de blusinhas abertas, exibindo o encontro triunfal do decote com o cinto; shortinho, sandálias, mascando chiclete; piercings na língua, na orelha, no nariz, na sobrancelha, no… Claro, no… também — até dava pra ver a marca se destacando!…
Ele ainda ouviu de um garoto gaiato para outro: “Mano, Deus é justo, mas a calça daquela mina…”
E os homens de bermudas? “Desde quando se vêm à missa com calça de pular brejo?” E havia marmanjos de calção, camiseta regata, distribuindo cecê a granel e em aerosol, raiders e sandálias havaianas, imagem de Nossa Senhora tatuada no braço… Cruzes!
Se não o seguram, monsenhor Baggio invadia o altar e parava tudo. “Heresia! Sacrilégio! Homens e mulheres distribuindo comunhão!? Pegando na hóstia consagrada?! Isto não é uma igreja, isto é o inferno!”
Ainda bem que ele não percebeu quando a garota mais sensual da paróquia recebeu a comunhão de um leigo que, distraído, em vez de anunciar “Corpo de Deus!”, arrematou: “Deus, que corpo!”.
Pregado no poste: “O Judiciário brasileiro é bonzinho…”

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