Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

2004Crônicas

Você percebe…

… que os anos chegaram, quando:

Os amigos do seu filho começam a chamar você de “tio”.

Você descobre que aquela garota que você pensa em paquerar tem idade para ser sua filha.

As pessoas que são apresentadas a você, naturalmente, o chamam de “senhor”.

Levantar de uma cadeira é cada vez mais difícil.

Você se assusta como estão “envelhecidos” amigos que não vê há alguns anos.

Em vez de ir ao cinema, prefere alugar uma fita ou esperar que o último vencedor do “Oscar” chegue às locadoras.

Sua mulher chega em casa mais disposta do que você.

No supermercado, você só compra o que está à altura dos seus olhos, mesmo que o produto mais barato esteja na prateleira de baixo da gôndola.

Sua barriga esconde seus documentos.

Para subir uma escada, precisa usar os dois corrimões.

Troca a caminhada pelo táxi.

Faz as contas e descobre que no último baile que você esteve, o sucesso era “Aquarela do Brasil”, tocada por uma orquestra que imitava a do Glenn Müller.

Todos os grandes craques de futebol são (bem) mais novos do que você.

Já faz 35 anos que o Brasil ganhou a Palma de Ouro em Cannes e a Glória Meneses, que então parecia ter idade para ser sua mãe, hoje parece apenas sua irmã.

Falam na Eva Wilma, e a imagem que lhe vem à cabeça não é de “A Indomada”, mas do “Alô, Doçura”, ou antes ainda, do “Prelude a Dois”.

A namorada do seu filho já chama você de “sogrão”.

Encontra um amigo e a primeira pergunta dele é “está bem de saúde”? E ainda recomenda a você um exame da próstata.

Você se lembra de que seus pais achavam o Elvis Presley “barulhento” e hoje, seus filhos o consideram “muito devagar”.

As letras dos livros e dos jornais estão cada vez menores.

Teima em fazer as palavras cruzadas até o fim, nem que precise consultar uma pilha de dicionários.

Costuma se interessar por bulas de remédios.

Vai atravessar a Treze de Maio e olha para cima, para ver se o bonde vem vindo. Ou sai das Lojas Americanas, na mesma rua, e pergunta: “Ué ? Cadê o teatro ?”

Abre o jornal e vai direto à coluna de falecimentos. Se ficar muito atento à idade dos defuntos, sua preocupação com a idade já virou paranóia.

Tenta assobiar e sempre vem um acesso de tosse.

Sai de casa e olha pro céu, para ver se vem chuva. E pensa seriamente em comprar uma capa e um par de galochas.

Ou você percebe que os anos chegaram quando acontece o que aconteceu comigo, dia desses, aqui em Campo Grande. Vi uma repórter, a Débora Diniz, escrevendo uma notícia em que ela se referia ao ditador Emílio Garrastazzu Médici. É melhor reproduzir o diálogo:

— Estou ficando velho, Débora. Você não era nascida e eu fazia reportagens sobre o governo desse sanguinário. Felizmente, vivi para ver essa gente fora do poder.

— Eu não era nascida, mesmo; mas sei quem foi ele. Estudei história no colégio.

— Nossa! Esse cara já entrou para a história?!

— Para a História Antiga, né?

 

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