Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

1999Crônicas

Três personagens e muitas paineiras

Você se lembra da Belisa Ribeiro? Ela mesmo, mãe do Gabriel o Pensador, ex-global, agora apresentadora da TV Educativa do Rio de Janeiro. E do Pauleca? Não?! É o José Paulo Piccoloto Naccarato, vereador combativo em Campinas nos anos setentas, hoje vivendo nestas bandas de Ribeirão Preto. E do Jânio Quadros? Desse ninguém se esquece. É só dizer o nome e o bafo vem junto.

Fui me lembrar deles por causa desse estrago que a CPFL fez com as paineiras da Avenida Orosimbo Maia. São mais de cem árvores majestosas, plantadas pelo próprio seo Orosimbo, quando prefeito desta cidade. E que prefeito! Se fosse vivo, não sobraria ninguém dessa CPFL para contar a história. Desde que aconteceu o crime, a memória começou a me incomodar. Liguei para o Pauleca: “Escuta, você não conseguiu tombar aquelas árvores, para impedir que uma via expressa fechasse o canal e transformasse a avenida do seo Orosimbo num deserto sem sombra e cheia de carros?”. Bateu: “As paineiras são tombadas, sim! Desde 1973. Elas não podem ser derrubadas! É só procurar nos arquivos da Câmara que o tombamento, aprovado, está lá!”.

E agora, dona CPFL? Será que seus dirigentes não sabem que tombar não significa derrubar? Quem mandou matar as paineiras é o mesmo que mandou assassinar o Alecrim da frente da Catderal? A senhora foi privatizada para dar luz ou para lançar mais escuridão na história da nossa Campinas? Coisa feia!

Foi aí que a Belisa Ribeiro, ainda uma jovenzinha, e o Jânio, já no fim da carreira, apareceram na história. Ele era prefeito de São Paulo e ela apresentava um programa na TV Bandeirantes. De tanto insistirmos, conseguimos que o “fujão” de 61, amante de uma 51, nos desse uma entrevista. Tudo foi marcado para uma manhã de Domingo, na casa do seu secretário Fauze Carlos: à tarde, o homem se mandaria para Londres. Ele adorava passear em Londres. Chegamos às nove da manhã. Ele e uma garrafa de vinho do Porto, já pela metade (!), nos aguardavam.

Como era de se esperar, ele se engraçou com o charme da Belisa, mesmo vigiado por dona Eloá. Naquele fim de semana, ela estava no Guarujá e subiu a serra especialmente para entrevistar o fujão. Chegou num vestido azul-turquesa, curtíssimo, combinando com a pele queimadíssima. O tema da entrevista da Belisa era o desrespeito do Jânio para com o patrimônio histórico de São Paulo. Ele estava desmanchando o Vale do Anhangabaú; mexendo no curso do Riacho do Ipiranga; abrindo o túnel que hoje leva o nome do Ayrton Senna… Vinha destruindo tudo como um trator.

Começou a se explicar: “Senhôra Belinda…”. Corta! “É Belisa, presidente.”. “Desculpe. Como eu dizia, senhôra Belinda…”. Corta! “É Belisa, presidente!”.

“Não vou errar mais. É que sua beleza mexe com meu eixo…”. Dona Eloá, que assistia a tudo de longe, sorria irônica, como que idolatrando aquela conduta insólita do marido. Então, a gravação continuou:

“Senhôra Belisa, eu não posso deixar de alargar uma rua, transformá-la em avenida, em benefício dos moradores, só porque um dia, d. Pedro I cagou ali”. Corta! “Mas eu falei Belisa!” “Mas falou cagou; cagou não pode!” “O que eu digo, então?”. Belisa sugeriu: “Diga escarrou, presidente, não fica tão ruim. Vamos lá?”.

“Só porque d. Pedro I escarrou perto do Riacho do Ipiranga e se limpou com o lenço da coroa, senhôra dona Belinda…”

Pregado no poste: “Quem vive da luz artificial não sabe o que é vida nem sombra.”

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