Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

2001Crônicas

Se esta rua…

Tem uns dois anos, conversamos aqui sobre a incrível “turma da faquinha” que existia em Campinas. Lembrei-me dela ao ver a luta do juiz Alberto Anderson Filho, da Vara da Infância e Juventude, que achou por bem (muito bem) tirar das ruas crianças em condições de risco. Ele enfrentará resistência “braba” de radicais, iguais àquela “tchurma” de ecochatos que sempre tenta impedir a construção de hidrelétricas e hoje critica o “apagão”. São os ignorantes que não fazem (por que dá trabalho) nem deixam fazer (porque dá inveja) e criticam quem faz (porque não têm o que fazer). Daí, a escuridão, meio de vida que tanto almejam.

Vão aparecer aqueles defendendo o direito de o menor ir e vir para onde quiser – de preferência, ir e levar droga. Também gostei das promotoras Elisa Camuzzo e Verônica Kobori: “Violamos o Estatuto quando o Estado, a família e a sociedade se omitem em proteger uma criança em situação de risco”.

O abrigo de menores era uma obra benemérita do bispo João Nery, para recolher meninos abandonados. Lição de vida que autoridades até hoje não aprenderam. Tinham cama, comida, roupa lavada, educação escolar e respeito. Tempos em que altar não era palanque, nem a sacristia, diretório. Entre as atividades que aquela criançada prestava à comunidade havia uma que contagiava a todos. Formavam a “turma da faquinha”. Sei de muito “figurão” que foi daquela turma e se orgulha. Contagiava, porque a gente ajudava a molecada a limpar o mato que brotava entre os paralelepípedos da cidade, com uma faquinha afiada.

O som da lâmina contra as pedras era inconfundível, contagiante o ritmo, contagiante a letra que cantavam: “Sou da turma da faquinha… Vou limpando esta rua… Como se ela fosse minha…”. Ao meio-dia, a perua de dom Nery vinha buscá-los para almoçar e estudar. Eram solidários. E nós, solidários a eles. A solidariedade acabou, menor abandonado é bandeira política, faquinha virou estilete e quando eles têm uma nas mãos, é para eliminar um parceiro de infortúnio. Claro, não se trata de reviver a turma da faquinha, mas de tirar crianças da selvageria que domina nossa cidade. Enfim, pessoas que querem fazer sem pensar em votos. Bola pra frente, seo Anderson, dona Elisa e dona Verônica. Os radicais – inflexíveis — desaparecem primeiro, como os dentes, que se vão antes da língua.

Pregado no poste: “Traficantes detestam essa medida”

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