Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

2006Crônicas

Sangue no pendão

Pouca gente ainda sabe, mas o feriado de amanhã é para celebrar a Proclamação da República. Nada demais. O marechal Deodoro foi tirado da cama e até chegar ao lugar marcado, no Campo de Santana, Centro do Rio de Janeiro, também não sabia que deveria anunciar o fim da monarquia. Mas alguém cutucou o cavalo, ele empinou e o homem achou melhor gritar “Viva a República” – e dele até Lulla é uma vergonha atrás da outra.

Juro por Deus: o Hino da República me martela as “orêia” desde o primeiro ano do Grupo. Mas nunca consegui entender a letra. A música do Leopoldo Miguez é bonita, mas a letra do Medeiros e Albuquerque… Mestres como Clélia Pires Barbosa, Carlos e Walter Zink, Lílian Nopper, Lídia Helwig, nossa Mariinha Mota Aguiar, Mário Scolari bem que tentaram.

O estribilho até empolga: “Liberdade! Liberdade! / Abre as asas sobre nós / Das lutas na tempestade / Dá que ouçamos tua voz!” O que sempre ‘pega’ é esse último verso: “Já coçamos tua avó!”. Francamente!

A abertura é uma bósnia: “Seja um pálio de luz desdobrado / Sob a larga amplidão destes céus / Este canto rebel que o passado / Vem remir dos mais torpes labéus! / Seja um hino de glória que fale / De esperança, de um novo porvir! / Com visões de triunfos embale / Quem por ele lutando surgir!” Pálio no Aurélio é ‘capa’. Capa de luz desdobrada? Como? Rebel? Nem no Aurélio nem na Fiat. Remir? Tive uma tia com esse nome, que significa “adquirir de novo”. ‘Torpe’ é nojento, mas labéu? Desonra não é mais fácil? A letra chegava assim: “Este samba revela que o passado vem cair no mais forte escarcéu”. Alguém já viu um velho porvir? E um biscoito de porvir?…

‘Vamo nóis’: “Eia, pois, brasileiros avante! / Verdes louros colhamos louçãos! / Seja o nosso País triunfante, / Livre terra de livres irmãos!” Loução!? Louros louçãos? ‘Louros frescos’!? Nem com loção. A conspiração da República passou por Campinas — será que foi ela que inspirou esse verso?

E esta: “Se é mister que de peitos valentes, / Haja sangue em nosso pendão, / Sangue vivo do herói Tiradentes / Batizou este audaz pavilhão!” Puts! Cada vez que ouço “sangue no nosso pendão”, dá um frio na espinha, um estado de nervo! Ainda mais porque o Aurélio diz que pendão pode ser a “inflorescência masculina do milho”!

Já correu sangue no pendão do seu milho? Dói?

Pregado no poste: “Adão e Eva nunca levaram chifres”

14/11/2006

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