Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

2001Crônicas

Salvo pelo rim

A história só se repete como farsa. Quando o general Emílio Médici (que Deus o tenha nas profundezas) inventou de ir a Paulínia, para inaugurar a Replan, foi um corre-corre daqueles. O cerimonial do Palácio do Planalto não sabia como riscar um nome da lista de convidados. E aquele nome proscrito, pela etiqueta, seria presença obrigatória. O coitado era prefeito de uma cidade da região de Campinas e não podia faltar ao palanque nem ao cordão de puxa-sacos. Afinal, fôra nomeado por aquele Laudo Natel, que, acredite, foi governador de São Paulo, delegado da ditadura militar. Como se vê, o estrago não começou hoje.

Acontece que o homem foi um notório banqueiro do jogo-de-bicho, quando essa jogatina era apenas uma inocente contravenção e não ponte para esconder e disfarçar o crime organizado, como hoje. O que fazer com o prefeito bicheiro? Imagine o dito cujo, baixinho, gordinho, careca, de terno de linho branco ao lado do chefe da Nação, “ao vivo, em cores, via satélite, para todo o Brasil”, como dizia Cid Moreira. “Vai ser um escândalo, não pode”, determinou o coronel-comandante do destacamento precursor, que veio de Brasília para organizar a solenidade.

Mas justo aquele prefeito ia faltar à festa? Faltou.

Quem tem, tem medo. Com muito jeito, convenceram o coitado a sentir uma terrível crise renal na véspera da inauguração da Replan. Para dar mais credibilidade ao “fato”, ele até se internou, ou foi internado, na Casa de Saúde. Cercado de amigos, cambistas ou não, o certo é que assim que o ditador partiu, ele sarou. Dizem que a pedra que lhe atazanava os rins foi expelida pelas rodadas de cerveja que animaram aquela noitada forçada em pleno hospital.

Nesta semana, quando vi no Diário Oficial, digo, no Jornal Nacional, o repórter Caco Barcelos, diante da mesma Casa de Saúde, anunciar a internação do excelentíssimo senhor professor doutor Fortunato Badan Palhares, antecipei: “É crise renal!”. Batata. Afinal, ali se realizou o primeiro transplante de rim em Campinas. Uma façanha que salvou a pele de muita gente. Pelo visto, continua salvando… Até quando?

Pregado no poste: “Organizado, no Brasil, só o crime”

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