Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

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Premonição

Há uns quinze anos, ouvi o relato estarrecido do presidente de uma cooperativa agrícola do Norte do Paraná. Acho que de Londrina. Ele disse: “Se você for a uma fazenda, dê uma olhada na lata de lixo da sede. Já é igualzinha à de qualquer casa da cidade: copos de iogurte; embalagens de frango resfriado; sacos de pó de café; caixas de ovos; garrafinhas de suco de laranja; caixinhas de leite; potes de mel; latas de milho cozido, de doce de leite, de goiabada; pencas de banana; bandejas de isopor, daquelas com pedaços de carne ou de legumes e verduras… É espantoso, ninguém mais quer saber de produzir na própria fazenda. Antigamente, na carroceria da caminhonete do fazendeiro, só iam sal e cerveja. Hoje, ele compra tudo no supermercado e leva para a propriedade aquilo que ele pode obter lá mesmo, melhor e mais barato…”

Como já observava a grande poetisa Cora Coralina, do alto de sua sabedoria, existe agricultor brasileiro tão burro, que vende para as multinacionais o milho que planta e depois compra a ração para alimentar sua criação. Com esse desabafo, nossa Cora chamava esse produtor de burro e de preguiçoso, ao mesmo tempo. Digo preguiçoso, porque nunca ouvi a Cora chamar ninguém de vagabundo. Mas já vi agricultor de asfalto pensando que cebola dá em réstia e que mandioca e cenoura nascem em árvores. Queria vê-lo debaixo de uma jaqueira… Mané!

Agora, no Festival do Filme Publicitário, em Cannes, foi exibido um comercial que retrata muito bem essa realidade. Nem sei se foi feito no Brasil, muito menos se foi premiado com algum “Leão”. Mas essa realidade burra está nele. Se passar na televisão, muita gente vai achá-lo genial. E é mesmo. Uma exibição de ignorância explícita: vê-se uma fazenda onde todos trabalham. De repente, uma mulher bate o triângulo (ou um sino?), para avisar que é hora de comer. Entram todos num carro e vão para o McDonalds.

Pregado no poste: “Há quanto tempo você não come carambola?”

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