Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

2002Crônicas

Para Sandra Lane

Recebi da grande mestra Quinita Ribeiro Sampaio esta mensagem. É uma lição. E se alguém souber da Sandra Lane, avise:

“A leitura de sua crônica acordou-me outra história do ‘Culto à Ciência’, cuja protagonista, uma menina de uns doze, treze anos, Sandra Lane, enveredou pelo campo do maravilhoso, em uma redação. O cenário era uma biblioteca, de estantes imensas e escuras, onde os mistérios rondavam entre alfarrábios. (Tão pequena, Sandra devia assombrar-se ao peso da austeridade da biblioteca do colégio!) Nesse cenário, em que seu coraçãozinho por certo batia descompassado, criou a minha aluna uma ficção interativa, bem antes de ‘A rosa púrpura do Cairo’, em que Woody Allen esgarça as fronteiras entre sonho e realidade e liberta seu personagem do ‘écran’, para entregá-lo, possível e pulsante, a uma fascinada espectadora.

Pois bem, ela imaginou, em contraponto às monumentais estantes, uma frágil figura de menina (quem sabe seu próprio espelho), mergulhada na leitura de um livro aventuresco. Já assustada com os muitos perigos que do livro pareciam derramar-se pela sala, sucedeu que, num ápice, a pequena leitora é arrebatada da realidade e sorvida pelas páginas escancaradas do livro, como tragada por um ser terrificante. (Sandra forjou uma interação em sentido inverso ao de Allen…)

Mas a brandura de minha aluna não seria capaz de infligir tão cruel destino a uma personagem (especialmente essa, criada à sua imagem e semelhança…). Então engendrou um desfecho, que reflete por certo sua ingenuidade, mas que foi para mim puro alumbramento. Eis que, de uma árvore fronteira, mais de mil besourinhos azuis de patinhas de ouro surpreendem as garras e bocarra desse gênio do mal, invadem a biblioteca — um exército de besourinhos azuis! –, e salvam a menininha indefesa.

Já não tenho uma nítida memória de como Sandra urdiu sua  trama, mas sei que o fez com tal graça e equilíbrio, que — também eu! — fiquei eterna e irremediavelmente presa, mas por vontade própria, aos encantatórios besourinhos de patinhas de ouro…

Pena não poder limitar-me a fruir a redação! Cabia-me o dever de corrigi-la. Como era longa, mais do que natural que tivesse seus erros. Ao final da correção, se fosse valer-me de critério matemático e cego (que, diga-se, jamais adotei), obrigava-me a descontar não sei quanto por erro. Mas eu não podia, não queria fazer isso. Tinha que lhe dar um dez! E foi o que fiz. No alto da página, escrevi uma coisa assim: ‘Que redação linda! Parabéns! Há uns erros, mas eles sumiram todos debaixo das patinhas de ouro dos besourinhos azuis!…’”

Pregado no poste: “D. Izalene, Campinas não foi digna de exemplo na campanha do PT?”

 

E passo a vida

E passo a vida assim a te espreitar

lá no final do ensolarado túnel.

Num desvelo inquebrável, infinito,

tua imagem vou tecendo em meu olhar.

 

Meu espelho me ensina o que mudar

no ocaso de tua face e de teus passos.

E busco avaliar que calor resta

nas mãos em que colheste o meu cuidar.

 

Houve a barra de fogo do oriente,

houve a ressurreição do entardecer,

mas a teia da noite é o imaginar.

 

E pois que anoiteceu rogo aos teus olhos,

se entrelacem aos meus na mesma sombra,

que é forçoso guardar-te a me guardar.

Quinita Ribeiro Sampaio

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