Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

2004Crônicas

O último Mané

Não o conheço pessoalmente, mas acompanho seu trabalho (e seus dribles) desde quando ele fazia de “joão bobo” um poderoso em Goiás. Ao contrário dos zagueiros driblados pelo alegre Mané Garrincha, o político perdeu a esportiva, escorraçou Kajuru, e nós ganhamos um belo humorista, boa praça, puro, ingênuo, que fala o que vem à cabeça, sem a intenção de magoar. Mas provocar é com ele mesmo. É como aquele torcedor de botequim, tipo que, infelizmente, está no fim.

Kajuru é ingênuo quando precisa e esperto quando quem precisa dele é o povo. Esse é o segredo desse jornalista, baixinho, gordinho, diabético, ex-míope, que peitou um campeão de boxe no ar e, não fosse a turma do deixa disso, seria pulverizado. Ele se indignou com o pugilista que massacrara um adversário já batido. Sempre ao lado dos pequenos.

Ousado. Com quase nada no bolso, se arriscava e saltava no espaço com seu “Exército Brancaleone” atrás das Copas do Mundo.

Estações poderosas armavam grandes esquemas de cobertura internacional: barracas de camping na porta das concentrações,
equipamentos antenados a satélites, mil engenhocas tecnológicas. Ele, só com um celular apontado para os entrevistados, conquistava mais audiência do que uma rede de rádio inteira. Se a CBN é “a rádio que toca notícia”, Kajuru é o “jornalista que se toca com a notícia”. A Jovem Pan é a “emissora dos esportes”? O Kajuru é o “jornalista dos esportistas”. A Rádio Globo “só da bola pra você”? A galera é quem “só dá bola para o Kajuru”. “Futebol é com a Bandeirantes”, mas para os esportistas, também é com o Kajuru.

Ano passado, ele e seu amigo José Luís Datena deram um show em Ribeirão Preto, cidade vizinha à sua Cajuru. Criaram a equipe “As feras do Datena e do Kajuru”, com direito a um pôster gigante na porta da “Nova Rádio 79” e outdoors espalhados pela cidade. A audiência foi para o pico. Os “Brancaleones” passaram a ousar. Nestas eliminatórias para a Copa do Mundo, de repente, em meio às rádios Globo, Bandeirantes, Pan, Record, CBN, lá estavam os intrusos do Kajuru — Davi aporrinhando Golias.

A cada jornada esportiva da tradicionalíssima “79”, Galvão Bueno falava na abertura. E o Kajuru brincava: “Aqui, Galvão Bueno, porque a 79 é a Globo do rádio”. A galera ia ao delírio.

Agora, tiraram o Kajuru do ar. Autoridades e cartolas, condoídos com a miséria em que devem viver a Giovanna Antonelli e seu Alexandre Acciolly, Ratinho, Flora e Gilberto Gil, Daniela Cicarelli, Débora Falabella e outras celebridades, abriram o Mineirão, para que assistissem, de graça, ao jogo do Brasil contra a Argentina. Na porta do estádio, o autêntico “jornalista dos esportistas”, perguntava: “E o povo? Por que o povo tem de pagar tão caro, enquanto outros entram de graça?” Da pista de atletismo, onde desfilavam autoridades, veio a resposta, que hoje todos sabemos, estarrecidos com esses democratas de elite: Kajuru afastado da Bandeirantes.

É o povo fora do ar, sem seu Chaplin da notícia.

Pregado no poste: “Mande demitir o povo, governador”

 

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