Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

2001Crônicas

O gato subiu no telhado

A piada é velha, mas aconteceu em Campinas, lá no Mercadão, há uns 40 anos. Lembrei-me da história, ao ler a reportagem da Iara Bueno contando que o tal do Poupatempo vai trazer para a cidade o serviço voluntário do escrevinhador de cartas para “deficientes alfabéticos”. (Melhor não arriscar. Vai que chamar algum analfabeto de analfabeto dá cadeia…). O filme “Central do Brasil” não contou nada de novo. Na Rua Direita, em São Paulo, na porta da casa Eron, havia o “Dr. K-Neta”, que fazia o mesmo trabalho, pero, cobrando.

No nosso Mercadão, alguns donos de armazéns faziam serviço parecido em favor do pessoal que vinha da roça para a compra do mês e dos imigrantes que tentavam a sorte na “cidade grande”. Não me lembro de nenhum que escrevesse cartas para as famílias daquela gente, deixadas principalmente no Sul de Minas e em alguns pontos do Nordeste. Mas havia os que liam as cartas mandadas pelos parentes daquelas bandas. Como o carteiro não percorria os sítios da redondeza nem os pobres nordestinos tinham residência fixa, os armazéns do Mercadão eram a referência deles.  Será que ainda são?

(Assim, cordial e democrático, era o Mercadão dos tempos de Jasmin e Salim Murtada; Albertina e Antônio Cecconi; seo Juca e dona Maria Vieira; Marchesini; Dino Zamarion; dos açougueiros Vavá, Pires e Adolfo; do seo Blascovi; da dona Rosa Tavares; dos jornaleiros Olésia e Nardo; do Pachola; de dona Mariquinha e seo Plácido Pelegrini… Campineiros como não se fazem mais!)

Um dia, apareceu um daqueles fregueses acidentais bem no armazém do seo Antônio Cecconi. Foi atendido pelo filho, o Ricardo, que nas raras horas de folga era o goleiro Cadão, do Esporte Clube Internacional do Bar do Kana Higa, ali perto do Centro de Saúde.

O homem não aparecia há um bom tempo. Cadão abriu a gaveta das cadernetas e, juro, tirou um maço de cartas, daquelas com envelopes marcados na borda por uma tirinha verde-amarela. Uma meia dúzia era para aquele senhor. E foi lendo uma a uma, em ordem de chegada. O coitado devia se chamar Raimundo: “Mãinha andou mal, mas vai melhorar.” Outra: “Levamos mãinha no doutor e ela ainda não melhorou.” Mais outra: “Doutor mandou mãinha ficar no hospital. É bom você ‘vim’ ver mãinha…” E a última; “Mãinha morreu.”.

Cadão, o que aconteceu com o coitado do moço?

Pregado no poste: “Paranóia: temem receber antraz por e-mail”

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