Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

2000Crônicas

Noite vazia

Mas ontem à tarde bateu uma saudade daquela Campinas! O chinês do Mercadão aqui de Ribeirão reformou a pastelaria. Fui conferir. O cheiro é igual ao da pastelaria do Voga, ali na Avenida Anchieta, em homenagem ao Cine Voga, que virou Jequitibá, virou bingo e acabou. Sabe aquele cheiro que leva a gente no tempo? É esse. Da pastelaria do chinês viajei rápido para o saguão do Voga e entrei na sala.

Passava “O maior espetáculo da terra”, história da viagem de um circo. Antes de a sessão começar, vieram imagens amarelecidas das pinturas na parede, homenageando Carlos Gomes –- O Guarani, Lo Schiavo, Fosca. Lembra? Coisas de Campinas: o maestro era homenageado no Voga; dele, o cine Carlos Gomes só tinha o nome. Ou essas imagens das óperas estavam no Cine Rádio? Socorro, Ciasca!

Quando “saí” do cinema, já estava escuro. Mas a cidade estava acesa. Gente elegante entrando no Armorial, para jantar e dançar. As salas da Escola Normal iluminadas por causa das aulas do período noturno; alunos correndo em direção ao Colégio Lencastre; alguns iam ao “Cursinho Vestibular Anchieta”, do professor Abramides; outros, mais velhos, saíam do trabalho para fazer madureza no Dom Bosco… Não, o Palácio dos Jequitibás ainda não existia, e seo Rosa vigiava tudo, satisfeito. Os “boys” estacionavam as primeiras lambretas ao lado do Café do Povo — alguns cobiçavam as jaquetas de James Dean expostas na vitrina da Garbo. O Regina, na Barão de Jaguara, servia os últimos cafezinhos; a Padaria do Comércio ainda fervilhava; a Kopenhagen exibia os ovos de Páscoa mais vistosos do mundo; pelas portas de vidro da Casa Assumpção, viam-se os long-plays, discos de vinil — novidade. Imagine, os músicos da banda Santa Cecília, quase todos funcionários da Prefeitura, chegavam para mais um momento de lirismo no coreto do Jardim Carlos Gomes. Quanta gente namorando! Hoje, ninguém mais namora…

“Voltei” triste para a pastelaria do chinês. A última imagem era a reportagem da Adriana Miranda, narrando a morte das noites da cidade.

Pregado no poste: “Não sei não é resposta; mas nós sabemos!”

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