Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

2002Crônicas

Modos

Campinas (tenho certeza de que era Campinas, uma Campinas que jamais vi), tarde de domingo, 9 de junho de 2002, num dos shoppings da vida:

A menina saiu da lanchonete mastigando uma coxinha — de boca aberta. O cabelo da que estava com ela não via água, sabão, pente nem escova havia umas seis luas – tinha o calcanhar rachado e a sandália encardida. Mas trazia um celular – pendurado no pescoço! A outra ainda tirou o resto de massa do céu da boca com o dedo e limpou a mão engordurada pela coxinha no sutiã roxo, que fazia par com a calça (comprida) alaranjada. As duas foram se econtrar com o que devia ser namorado de uma delas; só podia ser, porque enquanto esperava a balconista servir, palitava os dentes e coçava a orelha com a tampa da caneta Bic – verde. Ainda fez “som livre” na hora de beber.

Bem na frente da cafeteria, uma loja de discos (é ‘CD’ que se fala agora, né?). De lá, uma garota de seus doze anos, não mais, saiu empurrando todo mundo que via pela frente. Coitada, estava tão feliz, tudo porque comprou um disco, sabe de quem?, dessa tal de Kelly Key. Baba, boba, baba. Sua mãe deve ser fã do Gugu e o pai, que alternativa?, do Ratinho. A avó não desgruda do Sílvio Santos — mas o avô prefere o Faustão — e o irmão só ouve rock pauleira, porque falaram na escola que “isso é coisa de macho”. Baba, bobo, baba.

Inacreditável. Na fila de um dos cinemas – claro, “Xuxa e os doentes”, ou coisa parecida –, tinha mais gente do que numa escola inteira. Na sessão que terminava, as crianças (e os pais) saíam jurando acreditar em duendes (e na Xuxa) sobre todas as coisas. A papelaria, estrategicamente à frente do cinema, faturou como nunca: cadernos com a loira dos baixinhos na capa desapareceram antes que a outra sessão começasse. A moça, que trazia outra futura fã na barriga, sorria satisfeita. O marido, jovenzinho, aceitou, finalmente, que o bebê a caminho se chamará Sasha. Sasha, baby, Sasha — desde já.

Antes da corrida de muitos para o ponto do ônibus – e de alguns para o estacionamento –, era preciso entupir os toaletes. No chão, bem na porta do “feminino”, um guardanapo de papel sujo de mostarda. Ou seria um pedaço de papel higiênico?

Com certos vândalos que vivem em Campinas hoje, nunca se sabe…

Pregado no poste: “A senhora ainda está aí, dona Izalene? Pra quê?”

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