Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

2004Crônicas

“Meu Deus, isto não fala!”

O que sempre foi ruim está pior. Meu amigo Ethevaldo Siqueira, jornalista, autor do primeiro livro escrito por computador no Brasil, começou a obra calculando: “Se os interurbanos ainda dependessem das telefonistas nos Estados Unidos, hoje seriam necessárias 45 milhões delas para completar as ligações”. Tudo para mostrar a força da informática. Aqui, dá para começar um livro parecido, mas assim: “Se as ligações telefônicas continuarem dependendo da Telesp em Campinas, cada assinante ganhará um bumbo para se comunicar com quem quiser”. Tudo para mostrar o “avanço” tecnológico dessa estatal. Desde quando os telefones eram pretos e faziam “trrriiim”, esse serviço nunca funcionou direito na cidade. De bom, mesmo, só as telefonistas. A gentileza e dedicação delas compensavam a incompetência histórica da empresa.

Não sei onde ela enfia o dinheiro dos assinantes. Quando se vai a uma padaria, se paga pelo pão, mas se leva o dito cujo na hora. É assim com tudo. Menos com a Telesp. Ela toma o dinheiro e condena quem pagou a anos de fila. Quando a linha é instalada, ela “presta” um serviço “imprestável” e ainda cobra por isso. Reclamar? Só depois de pagar a conta. Se não pagar, ela corta — o que não faz muita diferença, telefone mudo e telefone da Telesp são iguais. Quando se economiza com interurbanos, ela acha que deveria ganhar mais e passa a cobrar ligações para a Grécia Antiga, Pompéia, Babilônia, Atlântida, Cesaréia, Machu Pichu, Jericó…

Duvida? Logo, logo, ela vai mandar a conta até para algum felizardo que nunca teve telefone na vida. Uma vez, ela deu o mesmo número da casa da minha santa sogra para um telefone novo que instalou no Bradesco. E ainda propôs trocar número da vítima. Ela erra e os outros que paguem pelos erros dela. De repente, o número do telefone da minha casa, em São Paulo, ficou igual ao do Serviço de Proteção ao Crédito — perdi a paciência e comecei a “limpar” a ficha de todo mundo na cidade. Como essa estatal não tem concorrente (falta pouco para essa porcaria de monopólio acabar, felizmente), ela deita e rola em cima do bolso da gente.

Logo que a Telesp se instalou em Campinas, começou a fazer o que mais sabe: besteira. Ela deu a uma farmácia do bairro do Taquaral o mesmo número do telefone da minha casa. Não sei como ela conseguiu realizar essa façanha. Os dois aparelhos nunca tocavam ao mesmo tempo. E eu também não sei como ela chegou a esse requinte de incompetência. Mas quando se trata de fazer errado, ela é perfeita. O dia inteiro ligavam pedindo para aplicar injeção, enviar remédios, saber preço de gumex, fitobilase, paragoge, anacoluto, edenil gotas. Tudo.

Uma senhora, acho que mulher do dono da farmácia, pensando que eu fosse o empregado, foi direto ao assunto:

— Fulano, quando o Rui vier para casa almoçar, manda ele trazer uma caixa de Modess pra mim.

— Pois não, senhora. Novo ou usado?

O que será que aconteceu? Nunca mais ligaram para a minha casa…

O título dessa crônica ironiza o espanto de d. Pedro II, há 121 anos, na exposição internacional do centenário da independência dos Estados Unidos, na Filadelfia. Do outro lado da linha, ao ouvir a voz de Graham Bell, ele exclamou: “Meu Deus, isto fala!” No tempo de Graham Bell, falava.

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