Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

2010Crônicas

Mentira de lenhador

(Ou de como o Geraldo Trinca apareceu no armário e não teve coragem de sair.).

Dizem que foi na Floresta Amazônica, mas o José Pedro Martins, amante contumaz da nossa flora e fauna, jura que as imagens revelam a exuberância da Mata de Santa Genebra. Fico com a sabedoria do Vicentão Torquato: “Foi no Bosque!”. Mas nenhum desses três refúgios ecológicos tem aquela monumental cachoeira digna da Foz do Iguaçu. Certo é que no filme o homem aparece perseguido por facínoras em trajes camuflados até os dentes e armados até as cuecas. Foi esse fugitivo, não se sabe de quem, que inspirou MacGyver, aquele que com um alicate de unha fazia transplante de próstata em elefante, sem anestesia.

Não é o Tarzan, Jim da Selva, Jane muito menos o Fantasma – posto que esses heróis não fugiam: espantavam tigres só com o hálito (não havia pasta de dentes) e matavam crocodilos a grito. O Trinca, não. No filme que ele mesmo me mandou, foge como a Chita – assim nasceu sua afeição pela macaca. Escapa dos tiros de metralhadoras israelenses, rifles americanos, flechadas de guaranis, estilingadas de portugueses e trepa em árvores como nunca ninguém trepou na vida. Do alto de uma, que mais parece um jequitibá, o maior susto. Um dos bandidos fere o tronco com uma motosserra (ou motodilma?) e a frondosa vem ao chão. Tão grande era a coitada abatida, que cai sobre violenta corredeira de um rio espremido entre montanhas.

O tronco, com o Trinca ainda trepado, ruma para a cachoeira, verdadeira catarata, e ambos despencam no nada. Corta. Ilustres membros da família Guidotti, guardiã do rio  Piracicaba, enfrentam os bandidos e Trinca escapa. Mas, desmaiado, só acorda com o barulho de outra serra, agora elétrica, na enorme marcenaria dos artífices da fábrica de móveis Zanoline. Não adianta berrar. Em segundos, ele se vê na linha de montagem – me lembrou Carlitos em ‘Tempos Modernos’ — e o guarda-roupa está pronto e fechado com ele dentro. A cena exibe o máximo da automação: o Zanoline já faz armários embutidos, patenteados. Nem os moveleiros de Gramado, Itatiba e Porto Ferreira descobrem o segredo.

Foi aí que o marido recém-casado chega do trabalho, abre o armário e dá com o Trinca lá dentro. A jovem mulher, vestida com apenas duas gotinhas de ‘Flor de Maçã’ e envolta num lençol quase sem manchas, ouve o herói do armário explicar para o marido como foi parar ali. E o homem acredita!

Pregado no poste: “Já reparou que ‘mulher’ não rima com ‘traído’; só ‘marido’”?

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