Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

2006Crônicas

Ingênuos

Wall Street, Nova York, City, Londres, Genebra, Milão, Zurique, Frankfurt, Tóquio, Hong Kong, Chicago… Aí se negociam moedas, títulos, ações — aonde aumentam, mudam de mãos, pulverizam, multiplicam, às vezes dividem, mas nunca se acabam as fortunas.

Há um bairro na Terra, só um bairro, cujo slogan pode ser “Seu sonho é o nosso negócio”. Hollywood o único lugar do mundo onde a arte só fez bem à alma e fizer bem ao bolso. Só é arte, se fizer dinheiro – riqueza, mas nunca espírito.

Não há movimento social que resista ao assédio desse bairro. Se não tiver magnitude, não representar ameaça ao capital, aos bens materiais, esqueça. Ele vai se desmanchar, esquecido e perdido.

Esse bairro sabe que para acabar com um movimento social basta glamourizar e comercializar a revolta. Nenhuma novidade: esse bairro sabe “dourar a pílula”, como diziam antanho. Aquela maravilhosa carta do cacique Seattle a um presidente americano defendendo a natureza não existe com aquele texto – um roteirista do bairro a descobriu, mexeu, achou o caminho para sensibilizar a alma e a transformou num protesto, quase bíblia, dos ‘ecochatos’. Caíram como patos.

O Festival de Woodstock é irreversível? Contesta o “stablishment”? Então, vamos comprá-lo com os dólares da sedutora indústria da música (até hoje, o negócio mais lucrativo do mundo, mais do que armas e drogas, como confirmam os CDs piratas). Os que sonharam com “Easy Rider” ficaram ricos; os que acreditaram, estão por aí — alguns até sem tomar banho, até hoje.

Não fosse a turma daquele bairro, a foto que Alberto Korda fez de Che Guevara a ver navios ardendo num porto estaria hoje amarelecida no álbum de Aleida. As guerras e a imagem daquela menininha nua fugindo das bombas napalm no Vietnã foram tão vulgarizadas, que hoje boa parte dos americanos nem sabe que seu país fez aquilo e que ainda está em guerra. Nem choram, porque até a defesa (e o ataque) da pátria está em entregue a quem ganha mais.

Para que o mundo não os culpe pela fome na África, fazem shows espetaculares “dedicados” a eles. O povo compra, expia a culpa e eles lucram. Tudo bem. Mas nenhum cantor africano foi convidado para “We are the world”.

Os “emeesses” da vida não empolgam a sociedade porque essa revolta não tem mercado. Por isso, a caravana passa, sem aplaudir nem vaiar.

Pregado no poste: “Coitado, o Lulla pensa que governa”

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *