Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

2005Crônicas

Há quanto tempo!…

Onde havia uma poça d’água de chuva, uma revoada de marimbondos chegava – era só voltar o sol. Há quanto tempo você não vê um marimbondo? Tanta saudade, que até dá vontade de lembrar da ferroada. Matar marimbondo com ripa. Difícil de acertar. E os ‘lacerdinhas’, então? Ai que ardido no zóio! Ardia tanto, que a gente pedia pra morrer. Sumiram os lacerdinhas – bichinho preto, miúdo, voador, de repente… Arrepia. Nem água corrente levava a dor. Tinha muito numas folhagens ali na cada do bispo d. Idílio, esquina da José Paulino com a pequenina Comendador de Paula Camargo.

Mamangaba. Grande, preta, do tamanho de um beija-flor. Mau agouro! Falar nisso… E os beija-flores! Também se foram, como partiram as andorinhas, os sabiás, tico-ticos, bem-te-vis… Ainda há pardais?

Lembra de que era comum ver minhocas secas, esturricadas pelo sol, grudadas no chão? Cadê? Nem minhoca viva se vê mais. Pegue um litro de creolina e jogue um pouco na terra. Elas vinham aos montes, prontas para servir de isca. Será que pelo menos a creolina ainda existe? E ácido muriático? Bateu? Que Gelol, nada! A solução era água végeto-mineral, o cheiro da dor.

Fale a verdade. Você ainda se lembra de como é uma taturana? E de bicho-de-fogo? Joaninha, mariposa, lacraia, luva-a-Deus… Ave! Maria-fidida? E os vaga-lumes, ainda piscam nas noites do seu jardim? Que jardim, né?… Borboleta antes de sair do casulo! Ainda no chão, aquelas formigas pretinhas, tão comuns, sumiram, como as saúvas (O Brasil acaba com as saúvas ou os políticos acabam com o Brasil, ou é vice-versa?).

Você soprava canudinho de papel para espetá-los em cachos de abelhas? Nossa! Havia um cacho no batente da porta da sala de Geografia, do professor Hilton Federici, cheio de canudinhos espetados. As abelhas nunca tiveram coragem de entrar na sala e atrapalhar a aula dele. Só as cigarras… As cigarras! Há quanto tempo você não ouve uma cigarra cantando?

Gambás. Sempre se via um perambulando pelas ruas. Uma vez, um gambá se enroscou num transformador da Zé Paulino; aconteceu um estouro, parou a força desde o quarteirão da fábrica de elásticos do doutor Sylvino de Godoy até a fábrica de chapéus do inesquecível Miguel Cury. O gambá torrou, coitado. Aqui em Ribeirão Preto, uma capivara apareceu no córrego que passa em frente à estação rodoviária. Um repórter de rádio deu a notícia e chamou o bombeiro, no ar, para “regatar” o bicho. Gostei da resposta do soldado: “Você gostaria que eu fosse tirar você da sua casa?”. Bati palmas para o rádio.

Lagartixa, sapo e perereca devem ser bichos de outro mundo, porque eu não os vejo há séculos. Sabe o que é pior do que achar um bicho na goiaba? É achar meio bicho. Goiaba não tem mais bigato. Nem maçã. É tanto veneno, que perdeu a graça comer uma fruta sadia. Hoje, em vez de se dizer que fulana “tem bigato na cabeça”, a gente diz que ela tem veneno na língua, uai!

O que se vê de sobra por aí é a invasão dos ratos. A propósito, alguém de nome Mano Meira (meus respeitos e aplausos), mandou este poema, muito oportuno, para o excelente sítio de assuntos jurídicos “Migalhas”, à disposição de todos na rede mundial. Leia se não vem a calhar:

“Fogo em Roma — Nero botou fogo em Roma / numa grande jogada, / a saída encontrada, / pra acabar com as ratazanas; / o acusaram de mente insana, / mas loucura não era motivo, / porque o fogo, foi o curativo / contra a peste bubônica. / Ao ver a notícia, maligna: / governador sendo extorquido, / deputados lhe exigindo / (que triste sina) / 500 mil pratas de propina, / vejo que já está na hora / de se agir sem demora, /  rápido e sem embroma, / acabando com a farroma, / dando de mão no avio, / acendendo logo o pavio, / pra lascar fogo em Roma!”

Pregado no poste: “Ô La Fontaine, vem contar tudo de novo!”

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