Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

2007Crônicas

Filme sem fim

Na sala de espera de um dentista, vi um livrinho no tamanho, mas um livraço no conteúdo. Seu nome: “As palavras cantam”, de 1993, do médium Chico Xavier psicografando Carlos Augusto Ferraz Lacerda.

Gelei.

Algo muito estranho me faz guardar na memória os nomes das 25 pessoas, a maioria crianças e jovens, que morreram em Campinas às 15 horas e 18 minutos do domingo, 16 de setembro de 1951. Desabou o Cine Rink, quando a matinê exibia o filme “Amar foi minha ruína”, para uma platéia lotada. A tragédia – provocada por negligência ou sabotagem – ainda feriu 400 espectadores, dos 1.200 que estavam na platéia.

Não foi acidente, conclui o laudo do Instituto de Pesquisas Tecnológicas, escondido por quase meio século, até a fantástica descoberta de um trio de recém-formados em Jornalismo, turma de 1996 da Puccamp: Christiane Ribeiro, hoje em Münich; Crislaine Coscarelli, no Diário Comércio & Indústria, após três anos em Londres, e Samuel Leite, dono de uma empresa de sites em Campinas. Foi o último grande “furo” de repórteres campineiros. Ainda falta descobrir quem mandou matar seo Toninho e quem foi o bandido mascarado, assassino dos anos 60.

Dos 130 mil habitantes da Campinas daquela época, 80 mil foram ao enterro. Está no livro que os três formandos escreveram “A última sessão – A tragédia do cine Rink”. Voltei a esse livro para ver se na primeira leitura deixe escapar algo sobre o Carlos Augusto. Mas ele está apenas citado na lista dos mortos.

Na psicografia do Chico Xavier, editada pelo Centro Espírita União, São Paulo, 1993, ele é identificado como filho do médico Oswaldo Lacerda e de d. Ynayá Ferraz de Lacerda, residentes no Rio de Janeiro. A primeira mensagem de Carlos vai direto aos responsáveis pela obra: “Alicerces demandam segurança. E, por isso, não se justificam decisões apressadas.” E a última parece remeter aos que socorreram as vítimas: “Não nos arrependeremos de auxiliar porque os dias se desdobrarão, imperturbáveis, repondo cada pessoa no círculo que lhe cabe e cada situação no lugar que lhe é próprio.”

Para mortos e sobreviventes de outras tragédias houve indenizações. Em favor das vítimas dos responsáveis pelo desabamento do Rink, que padecem até hoje, ninguém preocupado com os direitos humanos se mexeu. Nem quando a verdade cruel apareceu.

Pregado no poste: “Quem indeniza o povo pela tragédia provocada por políticos?”

 

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