Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

1999Crônicas

Era uma vez uma rainha

Na tarde de Quinta-feira Santa, conversei por telefone com o nosso Rogério Verzignasse, o “homem do Contestado”, para saber como vai aquela leoa que ele e o fotógrafo João Batista andaram espantando lá pelas bandas de Monte Mor. “Desde que saiu a reportagem, ela não atacou mais”, ele respondeu. O Rogério me pareceu muito preocupado com a sorte da primeira-dama do reino animal. Por um instante, me passou pela cabeça: “Será que ela leu no Correio que está sendo caçada e decidiu fugir?” Estranhando? Aqui em casa, até o cachorro lê o Correio Popular.

A coitada vivia trancafiada na jaula de um circo, obrigada a exibir suas belezas e virtudes ao povo, sob as ordens de um domador. Imaginemos uma situação inversa, um hipotético “jardim antropológico”, com seres humanos enjaulados, para serem visitados por animais. Da forma como a raça humana age em relação aos seus semelhantes, creio, os animais-visitantes não achariam graça alguma em assistir às nossas “exibições”.

O pessoal lá de Monte Mor, com razão, está de pé atrás e mão armada para eliminar a leoa. Enquanto isso, a Polícia Florestal, cumprindo seu dever e a missão para que foi criada, vagueia por matas, córregos e campinas, na esperança de pegá-la viva e adormecê-la com um tiro de sonífero. Nessa caçada, estou torcendo para a polícia chegar primeiro. O José Pedro Martins, mais verde do que bugrino envergonhado, também.

Mas pela reação do Rogério, é provável que alguém já tenha chegado e não foi um policial, não. E quem chegou primeiro, nestes tempos ecológicos, não está a fim de contar a proeza, para não ser crucificado. Pense bem: é fácil ser ecologista, quando não se está diante de uma leoa acuada em pleno matagal. Frente a frente, porém, a gente é capaz até de envenenar um córrego, para ela beber a água e cair esticada na outra margem. Como dizia a minha avó (e a sua também, eu acho), “quem tem, tem medo…”.

Os leões e suas digníssimas esposas são fascinantes. Mas eles lá e nós aqui. Até que Monte Mor descobriu rápido que há (ou havia) uma leoa rondando a cidade. Corre uma lenda, num país bem longe daqui, grande produtor de café, onde uma leoa também protagonizou uma história interessante. Contam que, num belo dia, apareceu uma leoa vagando na capital desse país. Rondou, rondou e ninguém se deu conta de sua majestosa presença.

Uma noite, ela decidiu entrar no congresso daquele país. A fome bateu e a leoa, obedecendo ao instinto, começou a devorar os congressistas.

Pela manhã, um deputado; à tarde, dois senadores. Nem sempre a refeição era farta, porque, como de costume, aquele congresso vivia vazio. E a leoa encontrava dificuldade para matar a fome. Mas foi se virando; afinal, era carne de gente bem nutrida, que ganhava bem, às custas do povo…

Diz a lenda que a leoa “papou” todos os parlamentares. Até a tal da Mesa diretora. E ninguém percebeu. Ninguém naquele país sentiu falta dos congressistas. A leoa comeu o Poder Legislativo inteiro e a nação nem tchum. Também, dizem que não serviam para nada…

Só foram descobrir que existia uma leoa no congresso, quando ela devorou o homem que servia o cafezinho. Ele era a única pessoa útil naquele recinto.

PS: Dedico esta crônica ao doutor Alcides Carvalho, brasileiro como poucos na história deste País, que me contou essa lenda. “Pena que seja só uma lenda, né mestre? Vamos tomar um cafezinho, meu caro amigo?”

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