E se não fosse a cana?
Ribeirão Preto, tarde de quarta feira: bate-papo entre um investidor japonês e um empresário produtor de açúcar e álcool. (Antes de começar a ouvir a conversa, imagine a cara do japonês, a cada gargalhada, igual à do brasileiro, quando ri de uma piada de português. Bem debochada, sabe como é?)
— Vocês têm trens para levar o açúcar até o porto?
— Temos, mas não usamos (de cabeça baixa).
— Ah! Ah! Ah!
— Mas logo, as ferrovias voltarão!
— Em quanto tempo?
— Ah, em dez anos!
— Ah! Ah! Ah!
— No Japão, levar de trem é muito, mas muito mais barato!
— Deve ser, mesmo!
— Quanto é mais barato de trem no Brasil?
— Nem sei. Faz tanto tempo que não temos trem…
— Nem sabe!? Ah! Ah! Ah!
(Quanto dinheiro perdemos! Quantos investimentos!)
— Sabe, transportar não é nossa função. Nós temos de colocar o açúcar e o álcool na porta da usina. O comprador tem de vir até aqui… Mas nós é que garantimos a qualidade dos produtos.
— Ah é? Oh! Ah! Ah! Ah!
— Então os preços devem mudar muito de um lugar para outro?
— Não. São muito parecidos, do Rio Grande do Sul até o Amazonas. No Nordeste… Antes de o governo sair do negócio, também era assim e todos se acostumaram.
— Mas como o governo se intrometia no negócio?
— Por decreto!
— Ah! Ah! Ah! Oh…
— O governo dizia quanto cada usina podia moer de cana e fazer de açúcar e álcool. Era tudo amarrado. Quando subia a gasolina, subiam o açúcar e o álcool.
— Não entendo! Ah! Ah! Ah!
— Agora, o álcool é produto de mercado, tem preço sujeito à oferta e à procura. A gasolina tem tarifa.
— Produto de mercado que custa quase igual no país inteiro?
— É…
— Ah! Ah! Ah!
— Vocês têm algum acordo para garantir a lucratividade do açúcar e do álcool? Se o preço do açúcar sobe muito no exterior, vocês não param de fazer álcool para fazer mais açúcar?
— Não temos acordo nem controle, mas sempre respeitamos nossos contratos. Os preços são fixados com o cliente durante o ano.
— Ah! Ah! Ah!
— Em sete anos, o preço do álcool passou de R$ 0,14 para R$ 1,05. Se eu tivesse feito só açúcar, ganharia a mesma coisa…
— Ah! Ah! Ah!
— Não tem perigo de a Petrobrás ‘matar’ vocês?
— Ela tentou uma vez, mas a cana mostrou que é mais forte do que ela e nós juntos.
E o negócio foi fechado!