Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

2008Crônicas

E depois?

Tudo bem. Mas quero ver depois de inaugurada a passarela.

Juro que até a eclosão da epidemia de municípios novos que contaminou o Estado de São Paulo no fim do século passado, eu conhecia cada um dos 572. E me desafiava por isso. Era bater o olho numa fotografia para vir o nome da cidade na hora. Meu compadre Adhemar Oricchio, editor da seção de Interior, do ‘Estadão’, vivia me provocando. Um dia, pegou pesado. Exibiu uma foto do arquivo e perguntou: “Onde fica essa pinguela?” Respondi na hora: “Entre Tupi Paulista e Dracena!”. Espanto geral. Nem eu acreditei. Foi muita sorte, mas até hoje, depois de mais de trinta anos, não contei ao Adhemar que aquela foto quem tirou fui eu, numa reportagem sobre o fim dos cafezais na região da Alta Paulista. Sacanagem. (Ou o Adhemar, depois de trinta anos, não contou que sabia ser minha a foto?).

Agora, quarta-feira, caí do cavalo. A primeira página do “Correio Popular” na Internet, claro, é muito menor do que a original. Trouxe uma foto do César Rodrigues mostrando uma família a atravessar uma linha de trem. Na hora, pensei: linha da Mojiana que passa pela Estação Guanabara em direção a um lugar outrora chamado “Pilha de Tijolos”, antes de chegar ao alto da Avenida Barão de Itapura, ao lado de antigo armazém do Sesi. Ali onde havia a porteira, lembra? Em seguida, caiu a ficha: “Não pode ser da Mojiana; essa linha é de bitola larga… Mas que lugar é esse, Dio Santo!?”. A Marly Versoso, telefonista desta nobre casa, que vê o jornal no tamanho original, esclareceu: fica em Sumaré. E disse mais: “Esses trilhos, diz aqui, cortam a cidade no meio e isola os bairros Jardim Primavera, São Domingos, Virgínio Basso e Vila Vale.” Pensei nas “Cidades Mortas” do Monteiro Lobato, abandonadas pela Central do Brasil.

Aí começa a nojeira: a população desses lugares, há mais de 40 anos pede às autoridades passarelas para que possam ir de um lado ao outro de Sumaré, sem arriscar a vida – “Muro da Vergonha” não foi só em Berlim. Se eles reclamam há 40 anos, com a tal de América Latina Logística, a omissão começou nos tempos da já agonizante Companhia Paulista, passa pela Fepasa, a Ferroban e todos os prefeitos de Sumaré até agora. Todos empurrando o povo pra lá e pra cá. E gente assassinada, mutilada ou ferida pelo descaso. Parece que agora a passarela sai (40 anos para fazer uma passarela!). E estão todos soltos!

Agora só me falta depois de a dita cuja ficar pronta, o pessoal continuar a cruzar a pé a linha.

Pregado no poste: “Depois da eleição, povo é só um detalhe”

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