Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

1998Crônicas

Dom “Quixote” Castanho

Dom Amaury Cstanho, bispo de Jundiaí, é uma figuraça. Tivesse vivido no século 16, seria ele, e não dom Quixote de la Mancha, o personagem de Miguel de Cervantes Saavedra, cavaleiro fidalgo, marcado por lutas inglórias, montado em seu cavalo Rocinante, sempre acompanhado do fiel escudeiro Sancho Pança, em defesa de sua Dulcinea del Toboso.

Na Grécia Antiga, esse bispo, que conheci ainda cônego, escudeiro de monsenhor Salim à frente da Puccamp em defesa da moral, seria Diógenes, aquele que vagava em vão pelas ruas de Atenas, carregando uma lanterna, à procura de um homem honesto.

Esse religioso tenta compor uma lista impossível de candidatos que pretende apoiar. Mas veja só o sonho de dom Amaury, narrado ao repórter Dario Carvalho Junior: “O candidato deverá se comprometer a não trocar de partido, a não participar de atos de corrupção e a não usar o mandato como trampolim político.”. Dom Amaury quer um termo de compromisso: “O candidato deverá garantir que lutará por valores como família, vida e honestidade.”. E continua sonhando: “Todos sabemos que o candidato ideal deve ser honesto, competente e sensível aos problemas do povo que lhe confere o mandato.”. Não é um dom Quixote de batina? Ninguém melhor do que o nosso Dario para ouvir dom Amaury. Ele é especialista em histórias em quadrinhos – tudo fantasia.

Lendo nosso Correio de domingo passado, lá no Céu, monsenhor Salim deve ter olhado para são Pedro e comentado: “Esse meu amigo não toma jeito, são Pedro! É um otimista incorrigível. Eu incluiria na lista de obrigações que, como legítimo representante do povo, cada candidato, se eleito, deveria comprometer-se a ganhar no fim do mês, o mesmo salário que o povo ganha. Deveria ir de casa para o trabalho na mesma condução em que o povo viaja. Deveria usar os mesmos hospitais, prontos-socorros e postos de saúde que o povo usa – sem furar a fila! Deveria matricular os filhos nas mesmas escolas em que os filhos do povo estudam. Deveria morar nas mesmas condições em que o povo mora. Deveria ter uma jornada de trabalho igual à do povo. Afinal, se não for assim, que povo eles representam? Quando eles se dizem ‘representantes do povo’, será que o povo não se ofende? Pelo jeito, não vai sobrar ninguém para entrar na lista do Amaury…”.

São Pedro, que “filava” o Correio pelo ombro do monsenhor, chamou a atenção: “Veja aí, Salim, o que diz essa reportagem do Bill Souza. O repórter descobriu que a troca de partidos é rotina para candidatos da região de Campinas. Tem um aí, veja!, que já mudou cinco vezes! Só com isso, mais de dois terços da lista do bispo já foram para o vinagre. Mesmo assim, seu amigo Amaury continua sonhando. O senhor fala tanto que o candidato ‘deveria, deveria, deveria…’. O senhor tem certeza de que o verbo e o substantivo dever existem na língua falada no Brasil?”. O ex-reitor da Puccamp tirou aqueles óculos de lentes grossas, enxugou uma lágrima com a manga da batina e lamentou: “No dicionário dos políticos, infelizmente, não.”.

Meu caro dom Amaury, o senhor não perde a esperança, né? Pois eu nunca tive.

PS: Edinho, eu avisei para você não estrear contra o Guarani, não avisei?

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