Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

1998Crônicas

Dois bandidos para viagem

Diz a nossa Dalen Jacomino que os campineiros não podem mais ir aos restaurantes, porque os bandidos não deixam. A solução é comida caseira ou “disque-qualquer coisa”.

Dalen, aceita uma sugestão? Uma reportagem mostrando aonde o campineiro pode ir, sem ser ameaçado por marginais. Acredito que a lista de dicas ocupará o jornal inteiro e o leitor concluirá que não deve ir a lugar algum, porque vive numa terra de ninguém. Outra recomendação que precisa acompanhar as indicações: “Vá armado e de braço dado com dois soldados”.

Pelo relato da Dalen, nem o “disque-qualquer coisa” é seguro, porque os assaltantes deram de atacar, também, os entregadores. Esses coitados, além da gorjeta, exigirão do comprador faminto pagamento da “taxa de risco”. Mais um pouco e veremos os entregadores trocando suas motos e bicicletas por tanques blindados, para entregar uma simples pizza no prédio da esquina. Mais: a refeição será entregue se o freguês permitir dividí-la com o marginal; caso contrário, terá a marmita envenenada. Aguarde: em breve, só levarão pratos em sua casa se você aceitar a presença do bandido à sua mesa. Não seria um belo programa de fim de noite para você e sua família? O que acontecerá depois da visita desse “convidado” inesperado fica por conta de sua imaginação: drama ou aventura?

Não é exagero. Há vinte anos, você imaginaria não ir a um restaurante ou não pedir comida em casa por causa de bandidos? Naquele tempo, que já não era bom, havia menos marginais e mais policiais. Hoje, da forma como certos policiais agem e, muitas vezes, nem agem, fica difícil saber quem é quem nas ruas.

Seria cômico não fosse trágico, como dizia a avó de não sei quem. Há uns dez anos, me diverti muito com uma cena promovida por um entregador de pizza, o gerente da pizzaria, três policiais militares, dois “filhinhos de papai” e um delegado de polícia. Aconteceu na frente do meu prédio, perto das 11 da noite. Assistia a tudo da sacada, até que pediram minha ajuda.

O entregador de pizzas vinha com uma pilha em direção a um apartamento vizinho. Na esquina, aqueles dois “filhinhos de papai”, que nunca têm nada para fazer na vida, decidiram dar um susto no pobre do entregador. Desceram do carro correndo e, com um revólver de brinquedo, “ameaçaram” o rapaz. Foi perto da pizzaria e o gerente viu tudo. Chamou a polícia e, em dois minutos, a “viatura” chegou. Flagrante: algemaram os vagabundos na hora.

O gerente reconheceu os rapazes, filhos de “gente bem” do bairro, e pediu que relaxassem a prisão. Entre ficar de mal com os ricos e a humilhação por que passava seu entregador, preferiu a alternativa mais safada. Você decide.

Só… que, só que…. a chave do guarda emperrou e quebrou na hora de abrir a primeira algema. “A outra, só na delegacia; e como é que agente vai explicar para o delegado que fizemos um flagrante vítimas de uma brincadeira?”. Para não aumentar o escândalo, me pediram para testemunhar o “equívoco”. Concordei, desde que todos fossem para o distrito e eu avisaria o seu dotô por telefone. Avisei: “Doutor, estão chegando aí um gerente de pizzaria, um entregador, três policiais e dois bandidos para viagem. Quer minha opinião? Solte o entregador e ponha o resto no xadrez. Eles merecem”.

 

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