Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

2004Crônicas

Como eram soberbos aqueles franceses…

Conforme o combinado domingo, Mário Alberto conta tudo:

“… aliás, o único negócio que acompanhava a soirée do Voga era o Restaurante Armorial, estabelecimento do italiano Angelo Lepreri, que reunia desde o final da tarde, em torno do piano de Arnoldo, uma pequena comunidade de expatriados franceses, técnicos e diretores da Rhodia, e seus novos amigos campineiros. Por uma temporada intensa e breve, entre fins de 1962 e começo de 1965, aquele ponto ferveu com a chegada de um grupo barulhento e prestigioso de exilados, Jacques Soustelle à frente. Eram cerca de três dúzias de acólitos do herói da resistência que, na década de 50, rompeu com o general Charles de Gaulle e aliou-se ao bando de oficiais malucos que tentaram assassinar o velho chefe para vingar os acordos de Evian, porta da independência da Argélia.

Soustelle era intelectual de grande calibre. Dona Matilde Pettine, titular de francês do Culto a Ciência, falava dele com reverência – enquanto algumas de suas alunas suspiravam pelo visitante. Este, porém, fazendo justiça ao renome de seu gosto, trouxera na comitiva os ouvintes para suas intermináveis perorações contra De Gaulle e, no meio daquele grupo heterogêneo de parisienses de extrema direita, se esgueiravam amores de ocasião, que o líder enfastiado e continuamente inebriado convocava para aplacar a nostalgia das noites parisienses.

É pouco provável que o garapeiro do Voga tenha servido ao antigo ministro naqueles fins de tarde bem regados a vinho e uísque. As memórias de Soustelle, que voltou a Paris anistiado, e reconquistou um lugar na constelação de historiadores bem vendidos que fazem uma das tradições da vida cultural francesa, mencionam vagamente as tertúlias na Campinas, descrita como remota e algo provinciana – e chegam mesmo a roçar pelo ambiente do Armorial, sem mencionar nomes ou situações.

Lá na baixada da General Osório, vítimas da expansão econômica promovida na segunda metade da década de 60 pelo regime militar, foram-se o garapeiro, a sorveteria oficial da Kibon e o próprio Cine Voga.”

Jacques Soustelle foi governador da Argélia, vice-primeiro-ministro e um dos maiores mexicanistas da história. No grupo também estava Georges Bidault, ex-primeiro-ministro e herói da resistência à invasão nazista. Como só no Brasil pode acontecer, Monsieur e Madame Bidault foram jurados num concurso de fantasias do Baile de Gala do Tênis…

Campinas era um espetáculo!

Pregado no poste: “Pagar imposto para sustentar político?”

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