Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

2004Crônicas

Antes e depois

Sabe aqueles anúncios com fotografias de pessoas antes e depois de usar um produto? Isso! Aquele gordão que fez ginástica, tomou remédio para emagrecer ou foi posto pra fora de casa pela mulher, porque não se emendava? Depois, ele aparece todo elegante, sorrindo, ao lado da digníssima, que até parece mais gorda do que ele… O careca, que passou a usar peruca; fez implante; esfregou xixi de gorila ou raiz de piaçava na cabeça, e hoje, cobre as férias do leão da Metro no cinema – mas se arrepende, quando descobre que é dos carecas que elas gostam mais. A vaidosa, que esticou tanto na última cirurgia plástica e aparece na fotografia exibindo uma mancha roxa nas costas… A mulher do machista, que trocou o carro por um aspirador de pó zerinho e ainda posa sorrindo e satisfeita para confirmar a eficiência do eletrodoméstico – gente maldosa diz que foi diante de uma propaganda dessas que Nelson Rodrigues escreveu “Elas gostam de apanhar”. O banguela, que trocou o que restava por uma reluzente dentadura e sai na foto mordendo a orelha da namorada (Puts! Essa é ridícula!).

O menino fraquinho, mirrado, que tomou o fortificante do anúncio e na foto seguinte sopra tanto o rabo do touro que até endireitou o chifre do bicho! Dia chegará em que um ‘perneta’ contratado sairá correndo, pulando e gritando de uma ‘igreja’ caça-níqueis: “Milagre! Milagre!”. Duvida? Falta pouco.

As fotos desses anúncios convencem. Mas outro dia, vi uma na última página da nossa revista “Metrópole“, que me chamou a atenção. A linha do tempo divide o rosto de uma linda mulher e a mensagem forte, bem dirigida: “Que o tempo fique marcado na memória, não em seu rosto”. Propaganda honesta, nada dessas enganosas, promete combater rugas de expressão, pés de galinha, sulcos profundos, manchas e acnes, envelhecimento da pele, queda de cabelos, flacidez do rosto, colo e pescoço… O que me atraiu na fotografia foi a beleza da expressão e do olhar daquela mulher “antes” do tratamento, em contraste com o imenso vazio da expressão demonstrado “depois”. Tenho certeza de que ao perguntar à mulher de “antes” o que ela está sentindo, você ouvirá histórias maravilhosas, alegres ou tristes, emocionantes ou dramáticas, mas todas cheias de vida. A outra, a do “depois”, é capaz de perguntar: “O que quer dizer ‘sentindo’?”

Pregado no poste: “A diferença entre uma de 50 e duas de 20 pode ser o vazio”

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