Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

2002Crônicas

A volta dos caipiras

Um amigo conta sempre sua história de quem começou humilde a vida e o aperto que passou quando comprou o primeiro carro, um Fusca 59. Partiu de Sertãozinho, orgulhoso com mulher e dois filhos pequenos, para ver a praia pela primeira vez. Destino: Guarujá. Um sobrinho foi encontrá-lo no começo da Anhangüera, em São Paulo, e o guiou até a entrada da Anchieta. “Daqui, é só seguir reto”. E retornou. Ele seguiu reto, mas encontrou um balão. E se perdeu em meio àquela balbúrdia. Alguém atendeu a seus apelos desesperados e parou no acostamento para ensiná-lo. A família caipira chegou, finalmente, à praia. Passou ali dez belos dias, menos o meu amigo, que não conseguia dormir: “Quero ver o dia de voltar! Não vou conseguir.” Ele é assim.

Quando voltou, o irmão desse meu amigo aproveitou para gozá-lo: “Você foi burro. Eu vou pra lá mês que vem. Sabe como tem de fazer? Eu paro um táxi e peço para ele me levar até a entrada da Anchieta. Aí, não erro nem passo vergonha que nem ocê, seu jacu.”.

(O táxi era um DKW Vemag vermelho — lembra? –, e o carro, bem, era um Skoda verde, fabricado na Tchecoslováquia. Os parentes do meu amigo nunca tinham ouvido falar em Skoda — só se preocupavam com marca de charrete. Muito menos em Tchecoslováquia. “Fica perto de Barrinha? Não?! Então, não sei.”.)

Foram. Só que o taxista, desconfiado, exigiu: “Eu levo, mas eu não conheço o senhor. Então, para eu não ser enganado, seu filho do meio – eram três guris – vai comigo. Lá, ele volta para o seu carro e vocês seguem viagem. Combinado?”. No primeiro semáforo, o táxi passou e o resto da família ficou. Perderam o DKW de vista. A mulher começou a esgoelar. Os irmãos fizeram xixi no assento e o marido só esbravejava: “Porca miséria! Mio bambino!”.

Quanto ao que temia voltar do Guaraujá, o alívio só veio na hora da partida. Viu um caminhão, Chevrolet Tigre, com chapa de Campinas, subindo a Serra do Mar e falou para a mulher: “Vamos atrás dele. De Campias pra Ribeirão e Sertãozinho, eu sei.” No bairro do Ipiranga, o caminhão entrou num posto. Meu amigo atrás. O motorista tomou um café, espreguiçou, foi pra boléia e… sumiu. Bateram na porta do “Tigre”. O homem, com cara de poucos amigos, ouviu: “O senhor não vai pra Campinas?”. E respondeu: “Por que quer saber? Só à tarde. Passei a noite na fila do porto…” Um dia eu conto como tudo terminou.

Pregado no poste: “Quem mora no mundo é inquilino dos Estados Unidos?”

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