Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

2004Crônicas

A mestra generosa e o pequeno sábio

Da mestra, não sei nem o nome; mas aquele gesto, que jamais sairá da memória de quem viu, só poderia ser de uma professora. Ela é bonita, como todas as professoras. Desembarcou de um ônibus da cidade de Pontal, à frente de um grupo de alunos de onze-doze anos, no Parque Curupira, aqui em Ribeirão Preto. Uma revoada de crianças pousou na pista, no gramado, em torno das quedas d’água, nas rampas, à beira dos lagos – fascinadas com os  peixes, no palco, à nossa frente, em toda a parte.

Linda aquela algazarra, até que um menininho negro deu um grito, lá do outro lado, ao pé da estátua do Curupira. Mas um grito daqueles. A professora chegou primeiro até das crianças que estavam mais perto do garoto. Ele berrava de dor de dar dó. Não sei como se feriu, mas a perninha direita tinha um rasgo de quase dez centímetros. Sangrava. Sangrava muito. Enquanto a gente do parque buscava socorro, ela despejou na perna machucada a água mineral gelada que trazia, sentou no gramado, deitou a cabeça dele no colo, junto ao seio, e – incrível!!! – ele parou de chorar na hora! Quando chegaram para levar os dois ao hospital, aquela mestra parecia a Pietá, de Michelangelo, com Jesus no colo. “Só as professoras!”, pensei. Uma lágrima rolou.

Agora, o Daniel aprontou mais uma. Foi no mesmo dia. Oito anos, filho de Campinas, do cientista Evaristo Miranda e da jornalista Liana John, esse menino especialíssimo mostra ao mundo que aquele que estava no colo da Pietá tem razão, quando diz: “Eu Te louvo, Deus dos Céus, porque escondestes estas coisas dos sábios e inteligentes e revelastes aos pequeninos.”. Daniel adora padarias, pão com manteiga, café com leite. Entrou com o pai. E o balconista começou o desfile de asneiras, diante daquela carinha de anjo, pensando tratar-se de… Sei lá o que se passava na cabeça daquele vendedor de uma padaria do Taquaral:

— E o menininho, aí? Se ele não sabe falar, o pai pode dizer o que ele vai querer?

— Não, ele fala, sim, pergunte a ele.

— O que você quer?

— Pão de queijo.

— Quantos?

— Cinco.

O asno pôs a cestinha com os pães e continuou:

— Você sabe contar? Se você não me disser, certinho, quantos pãezinhos tem aí na cestinha, eu não te dou o pão de queijo.

Antes que o pai saltasse o balcão, Daniel, ainda constrangido, exibiu aquele olhar tirado do canto dos olhos e deu a resposta dos sábios pequeninos:

— Pode ser em Inglês?

Pregado no poste: “Enquanto houver professoras e ‘Daniéis’, haverá esperança”

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