Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

2003Crônicas

A corda e a faca

Acabei de ler “Grama, a biografia de Magalhães Teixeira”, do jornalista — bota jornalista nisso – Luiz Guilherme Fabrini e do cientista político José Manuel Lourenço. Hoje, às sete da noite, o livro será lançado na Assembléia Legislativa, mas é digno de ser lançado na Assembléia Geral da ONU. É de um Grama que a diplomacia precisa. Sabe por quê? Existem passagens nessa bela obra que definem bem o perfil daquele mineiro que, a um só tempo, adotou Campinas e foi adotado por ela.

Começa com a epígrafe do capítulo 4, “A conquista de Campinas”, escrita pelo advogado Hamilton de Oliveira: “Grama foi um forasteiro que veio para uma cidade considerada, na época, dificílima para alguém conseguir seu espaço. E ele penetrou nessa sociedade, conquistou e venceu mais do que qualquer campineiro, porque ele era uma pessoa boa.”

De fato. Aquela fama de campineiro orgulhoso… Lembra? É que naquele tempo este povo tinha do que se orgulhar – hoje, só do que se envergonhar. Ao ser apresentado a qualquer campineiro, a primeira pergunta, antes do “Muito prazer”, era “Você é de Campinas?”. O cenário emblemático desta cidade fechada está descrito no livro: “A região central de Campinas, na segunda metade dos anos 50s, era o grande ponto de encontro dos jovens. Bares, cafés, clubes, restaurantes, sorveterias, cinemas, escolas, universidade, lojas, livrarias, praças, monumentos, prédios históricos, o belíssimo Teatro Municipal, enfim, tudo o que a cidade tinha de melhor estava concentrado ali. …O movimento na esquina mais concorrida de Campinas começava por volta das onze horas da manhã — misturando alunos da Universidade Católica com estudantes secundaristas de diversas escolas vizinhas e homens mais velhos que adoravam o café da casa – e se estendia até tarde da noite.”

Foi desse reduto que o Grama nos conquistou. Com seu jeito de ser, começou a mudar o jeito de ser dos que só aceitavam campineiros nas rodas. Uma fama secular se desmanchava. Jamais deixava alguém de fora – ou todos ou ninguém. E assim viveu sua vida, desde as festas do colégio e da faculdade até na atividade profissional e pública. O magnífico trabalho do Fabrini também é contar a história do homem que viveu para a inclusão desde quando esse termo não estava na moda. A diferença é que ele praticava a inclusão. É exatamente o que falta ao mundo hoje: quem saiba viver para incluir. Quem prefira a corda em vez da faca.

Foi nosso último prefeito. Muito além de humano, com visão da Humanidade. Talvez Toninho seguisse seus passos. Mas foi cortado e depois dele não param de nos cortar a alma campineira.

Pregado no poste: “Precisa de uma corda, dona Izalene?”

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