Moacyr Castro

Crônicas, reportagens e entrevistas.

1998Crônicas

A “Capital da gentileza”

O inesquecível radialista e historiador campineiro Jolumá Brito criou uma expressão que a Rádio Educadora usou como vinheta durante o fim dos anos 50s e toda a década dos 60s: “Campinas, capital da gentileza”. Chegou a ‘pegar’. A intenção do velho Jolumá era combater, de forma sutil, a fama de que os campineiros são orgulhosos, bairristas, arrogantes, algo prepotentes, uma espécie de “franceses” atacados de xenofobia cabocla.

Para ajudar o Jolumá, o humorista, também campineiro, também falecido, Renato Corte Real, muito popular na então boa TV Record, criou outro mote para enaltecer sua cidade do coração: “Eu sou da República dos Estados Unidos de Campinas!”. E ‘pegou’, principalmente entre os campineiros que trabalhavam nas emissoras de rádio e televisão de São Paulo e do Rio: Moraes Sarmento, Luciano do Valle, Regina Duarte, César Ladeira, Kalil Filho, Ayrton Rodrigues, Reynaldo Dias Leme, Geórgia Gomide, Roberto Corte Real, Alfredo Orlando, João Dias, Carlos Zara… Até o não-campineiro Jô Soares, muito amigo do Renato Corte Real, adotou a expressão e ajudou a popularizá-la, já na TV Globo, no programa “Faça humor, não faça guerra”, que a dupla apresentou até a morte do querido Renato.

Esse comportamento, digamos, diferenciado, não é tão acentuado quanto à fama, mas sempre dá sinais aqui e ali. Dizem que campineiros não se cumprimentam na rua, para mostrar que a cidade é grande, tão grande, que ninguém se conhece. Isso, desde os tempos em que esta terra era uma vila, a Vila de São Carlos. Falam que uma pessoa estranha ao ser apresentada a um campineiro, antes do “muito prazer”, ouve a pergunta: “Você é de Campinas?”. Se não for, jamais ouvirá o “muito prazer”…

Alguns campineiros mais radicais, como a Zezé de 32, por exemplo, vão fundo. Um dia, numa repartição pública dessas por aí, ela tinha de fornecer seus dados pessoais para uma ficha de identificação. O burocrata perguntou: “Nacionalidade?” Ela mandou ver: “O senhor põe ‘brasileira’ por sua conta, porque eu sou é campineira, ouviu bem?”.

Está certo que esta cidade tem muito do que se orgulhar, muito mais do que as outras, embora esteja se vulgarizando e se estragando, tanto ou mais do que as outras. (Na classificação da ONU, já é a vigésima, em relação às desse país que fica em volta dela, chamado Brasil.). Mas, às vezes, exageram na exibição de seu caráter esnobe.

Será que Campinas ainda é a “Capital da gentileza”, sonhada por Jolumá?

Com a palavra o guarda de trânsito na hora da multa; os funcionários de empresas aéreas em Viracopos, enfrentando eventuais figurões que querem por que querem um lugar no avião lotado (cena ridícula: certa vez, um juiz exigia que um avião, que já havia decolado, voltasse para o meritíssimo embarcar); taxistas obrigados a levar gente “importante” apressada; atendentes de boutiques mais sofisticadas diante de madames sempre pernósticas ou mal-amadas; porteiros de boates ‘chiques’ às voltas com filhinhos de papai arruaceiros; garçons de restaurantes refinados na hora da conta ou de fregueses, digamos, alterados; aqueles coitados que ficam atrás dos guichês e bilheterias em cinemas, agências bancárias ou dos Correios, repartições públicas; camareiras de hotéis tendo de agüentar ataques de estrelismo de… estrelas, globais ou não.

Pregado no poste: “Visite São Paulo, o nosso distrito industrial…”

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *